segunda-feira, 31 de março de 2014

STJ: Relatora rejeita Habeas Corpus de ex-diretor da Petrobrás preso por suspeita de destruição de documentos




Relatora rejeita pedido de habeas corpus para ex-diretor da Petrobras A ministra Regina Helena Costa, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), rejeitou o pedido de habeas corpus feito em favor do ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa, preso desde o último dia 20 por suspeita de destruição de documentos referentes à operação Lava Jato, da Polícia Federal.

O habeas corpus foi impetrado contra ato de desembargador do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, que havia negado liminar em habeas corpus semelhante. Ao decidir, a ministra Regina Helena Costa ressaltou que o STJ possui entendimento pacificado no sentido de não admitir habeas corpus contra decisão de segunda instância que apenas negou liminar, sem ter havido julgamento do mérito do pedido.

Segundo a ministra, esse entendimento só é afastado, em caráter excepcional, “quando evidenciada a presença de flagrante ilegalidade”.

De acordo com a relatora, uma vez que não ficou configurado manifesto constrangimento ilegal merecedor de reparação, capaz de justificar o excepcional cabimento do pedido, “o indeferimento liminar da impetração é medida que se impõe, sob pena de supressão de instância”.

Pedidos

No habeas corpus, a defesa do ex-diretor requereu, liminarmente e no mérito, a concessão da ordem para que Paulo Roberto Costa fosse colocado em liberdade e para que o juízo de primeiro grau se abstivesse de decretar nova prisão preventiva pelas mesmas razões.

Alegou que, após a prisão de Costa, sua casa, o escritório, a residência de suas filhas e de familiares foram vistoriados, não havendo outras buscas a serem realizadas, nem prova a ser colhida.

Subsidiariamente, pleiteou a concessão de prisão especial e a manutenção do paciente na cidade do Rio de Janeiro, local onde residem seus advogados e familiares, bem como a adoção de medida cautelar alternativa à prisão.

Para a defesa, a transferência de Paulo Roberto Costa para Curitiba é ilícita e viola o disposto no artigo 5º, LXIII, da Constituição Federal. O ex-diretor foi preso no Rio de Janeiro e posteriormente transferido para Curitiba pela Polícia Federal, que centraliza as investigações da operação Lava Jato.

Citando vários precedentes, a ministra Regina Helena Costa reiterou que, de acordo com a jurisprudência do STJ, não cabe habeas corpus contra decisão denegatória de liminar, salvo em casos de flagrante ilegalidade ou teratologia da decisão impugnada. Assim, o STJ nem sequer irá analisar o mérito do pedido. 

STF: ADI questiona resolução do TSE que estabelece a necessidade de requisição judicial para instauração de inquérito eleitoral


ADI questiona resolução do TSE sobre apuração de crimes eleitorais

O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, questionou no Supremo Tribunal Federal (STF) resolução editada pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) para dispor sobre a apuração de crimes eleitorais. A Resolução 23.396, de dezembro de 2013, estabelece, entre outras regras, a necessidade de determinação da Justiça Eleitoral para a instauração de inquérito com o objetivo de apurar crime eleitoral.

Na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5104, o procurador-geral questiona 11 dos 14 artigos da resolução, alegando que há nos dispositivos a usurpação da competência legislativa da União para disciplinar o processo penal, contrariedade aos princípios de juiz natural imparcial e inércia de jurisdição, e injustificada limitação à atuação do Ministério Público Eleitoral.

As inconstitucionalidades mais graves decorrem, segundo a ADI, do artigo 8º da resolução, em que se estabelece a necessidade de requisição judicial para a instauração de inquérito eleitoral. “A norma viola, a um só tempo, o princípio acusatório, o dever de imparcialidade do órgão jurisdicional, o princípio da inércia da jurisdição e a titularidade da persecução penal, que a Constituição atribui ao Ministério Público”, afirma o pedido.

Alega o procurador-geral que a resolução também cria fase judicial de apreciação sobre notícias-crime não prevista legalmente para outras infrações penais, o que atenta contra o princípio da celeridade. “Imagine-se o enorme risco de prescrição e de ineficiência do processo eleitoral no caso em que, no simples início da investigação, o juiz discorde da instauração de inquérito requisitada pelo Ministério Público e seja, por isso, necessário interpor recurso”, diz a ação.

Rodrigo Janot chama a atenção para o fato de haver eleições este ano, e requer a concessão de medida cautelar para suspender a eficácia dos dispositivos questionados. No mérito, requer a declaração de inconstitucionalidade dos artigos 3º a 13 da norma.

Para ler a petição inicial da ADI, vide aqui.

 

domingo, 30 de março de 2014

Ninguém merece ser estuprado, mas, também, ninguém merece esta pesquisa malfeita do IPEA


A pesquisa do IPEA sobre a tolerância social à violência contra as mulheres provocou uma grande comoção nacional. Inclusive, grupos de pessoas enormemente indignadas com o resultado promoveram uma grande movimentação nas redes sociais com o slogan #nãomereçoserestuprada.

A grande indignação estaria vinculada pelas conclusões dos autores da pesquisa que sustentam que uma parcela significativa da população brasileira defenderia o estupro no caso da vitima usar roupas provocantes ou quando se comportasse inadequadamente.

Destaca-se que é absolutamente compreensível a indignação com qualquer argumentação em defesa do indefensável estupro. Também é inegável que a mulher brasileira encontra-se particularmente vulnerável à violência física, moral, psíquica, econômica e social, sendo mais do que devido políticas públicas para prevenção e repressão de tais odiosas práticas, especialmente, o estupro. De fato, é absolutamente inatacável a sentença que vaticina que ninguém merece ser estuprado. Porém, depois de ler atentamente a pesquisa e os seus procedimentos metodológicos, muitos problemas se destacam.

A pesquisa se utiliza de sentenças vagas, interpreta equivocadamente dados, falha em inter-relacioná-los e parte de uma interpretação ideologicamente orientada.

Alguns dos principais problemas são expostos a seguir, quando apresentados problemas de argumentação, interpretação e redação, em determinadas questões da pesquisa.



TODA MULHER SONHA EM SE CASAR.

Foram perguntados aos entrevistados se eles concordavam com a seguinte afirmação: "Toda mulher sonha em se casar". Uma parcela bastante significativa concorda totalmente com a proposição (50,9%), enquanto outra concorda parcialmente (27,8%). Desde tais números concluem os pesquisadores:

"Mais da metade dos entrevistados concordou totalmente com esta frase. Somados aos que concordam em parte, tem-se que quase 79% da população possui noção bastante estereotipada sobre os desejos e ideais de vida das mulheres. Acreditar que toda mulher tem como projeto de vida casar-se e constituir uma família é compatível com a ideia de que a mulher somente pode encontrar a plenitude numa relação estável com um homem, ou, ainda, de que depende de um companheiro que a sustente e, finalmente, de que é mais recatada e possui menos desejos sexuais, não almejando, portanto, uma vida de solteira ou de muitos parceiros".

O problema desta linha de interpretação dos dados reside nos fatos que os pesquisadores deixam de levar em conta que 66,5% dos entrevistados é do gênero feminino e somente 33,5% são homens. Significa dizer que mesmo que todos os homens sejam da opinião que o público feminino tenha o sonho do casamento (uma impossibilidade estatística), isso implicaria que os 45,2% dos entrevistados (a maioria) que concorda que a mulher sonha em se casar é composto, justamente, por mulheres.

Esse percentual de 45,2% de respostas de mulheres que concordam com a afirmação do casamento com sonho feminino implica dizer que de todas as mulheres entrevistadas, um mínimo de 67,9% concorda - total ou parcialmente - com tal proposição.

Sendo assim, é verdade que nem toda mulher sonha com o casamento, mas, por outro lado, é demonstrado pelos fatos que a grande maioria do público feminino reconhece o casamento como um sonho. Ora, confiando na precisão dos dados impõe-se o reconhecimento de que 2 (duas) em 3 (três) mulheres concordam que o casamento é desejo feminino. Assim posto, resta bastante complicado sustentar que os homens sejam machistas. Isso por que, os números demonstram que, o sonho do casamento é, de fato, um anseio da maioria das mulheres.

Seria como dizer que a sociedade é machista por acreditar no estereótipo de que o casamento é o sonho de toda mulher, ainda que, de fato, seja o sonho da grande maioria.

Se os números coletados permitem concluir algo, antes de concluir pelo machismo, é que, de fato, uma grande percentual de mulheres sonha com o casamento.

TEM MULHER QUE É PARA CASAR, TEM MULHER QUE É PARA LEVAR PARA CAMA

Os dados coletados na pesquisa do IPEA permitem afirmar que um número bastante considerável de pessoas concorda com a correção da popular proposição. Quanto aos números, concluíram os pesquisadores:

"Classificar as mulheres de acordo com seu comportamento sexual, avaliando-o sob a perspectiva masculina, e considerar que mulheres sexualmente livres não são boas companheiras são ideias que evidenciam de forma gritante o sexismo presente em nossa sociedade".

Novamente, permito-me discordar da interpretação dos dados realizada pelos pesquisadores do IPEA e, em razão de minha discordância, peço paciência para explicar meus motivos.

Desde a revolução comportamental - derivada da introdução da pílula anticoncepcional no cotidiano da sociedade brasileira e das consequentes possibilidades de desvincular o ato sexual de uma gravidez indesejada - é possível reconhecer uma progressiva liberação moral nas questões afeitas à prática sexual, talvez somente refreada, temporariamente, com o advento do fantasma da AIDS nos anos 80-90. 

É impossível negar que desde os anos 60, experimenta-se, em virtualmente todos os países ocidentais, uma crescente emancipação sexual da mulher, que podendo controlar razoavelmente o advento da gravidez, logrou êxito em modificar completamente a dinâmica das relações sociais. Por exemplo e especialmente destaca-se a grande e mais do que justa inserção das mulheres no mercado de trabalho.

Mas ainda permanece correto dizer que algumas mulheres são para casar e outras para transar. Isso significa machismo? Não necessariamente. Significa dizer que também existem homens para casar e homens para transar. Explica-se antes que qualquer acusação de machismo seja proferida.

Entendo por razoável sustentar que os critérios que levam uma pessoa a escolher um(a) parceiro(a) sexual são consideravelmente diferentes da escolha de um(a) cônjuge. Dito doutra maneira, as exigências para que alguém seja elegível enquanto parceiro(a) sexual são diferentes daquelas que se demandam quando o que se procura é alguém para o compromisso do casamento.

Não me parece um absurdo machista dizer que o homem procura qualidades diferentes em uma mulher conforme deseje somente o ato sexual ou quando selecione uma consorte. Da mesma forma que não acredito ser despropósito feminista dizer que uma mulher, desejando somente um parceiro sexual, seja menos criteriosa, do que seria quando deseja um marido.

Exemplificando: Seria um absurdo que uma mulher se sinta excitada sexualmente por um homem que lhe atraía fisicamente, mas ainda assim, analisando seu comportamento, entenda que não é um candidato ideal para o casamento? Não me parece ser o caso. 

Ora, se em regra, uma pessoa (homem ou mulher) é menos criteriosa quando escolhe parceiros ocasionais para a prática sexual do que seria quando escolher um cônjuge, pode-se bem afirmar que existe sim homens ou mulheres para transar e homens ou mulheres para casar, sem que com isso seja-se misógeno, chauvinista ou machista.

Interessante destacar um trecho de uma pesquisa da PUC-SP (GIANFALDONI, et. al.. Psic. Rev. São Paulo, volume 18, n.1, 99-111, 2009):

"Os dados indicaram que existem diferenças entre critérios usados por mulheres para selecionar seus parceiros para relacionamentos de curto e de longo prazo. Utilizando o mesmo tratamento para todas as categorias, os resultados evidenciam que as mulheres mostram-se menos exigentes quanto a parceiros de curto prazo, uma vez que elas atribuíram valores numéricos mais baixos para as características destes potenciais parceiros em relação às características que ela mesma julga possuir".

Demonstrado, pois, que não somente homens categorizam suas parceiras em aptas para um relacionamento curto e aptas para um relacionamento longo. Mulheres também selecionam seu parceiros da mesma maneira. Ou seja, conforme afirmado, existem homens ou mulheres para transar, bem como, existem homens ou mulheres para casar.

MULHERES QUE USAM ROUPAS QUE MOSTRAM O CORPO MERECEM SER ATACADAS

Eis aqui um exemplo de uma questão mal formulada que pode dar vazão a um número considerável de interpretações. Considerando que o termo "atacar" pode ser compreendido desde vários significados e, especialmente, reconhecendo o grande número de jovens entrevistados (28,5%) que são comumente associados com a utilização de gírias e coloquialismo, deve-se pontuar que a escolha de tal redação é deveras ambígua e imprecisa.

Ainda sobre os significados da palavra "atacar", pode-se destacar que não raramente ela é utilizada no sentido de criticar. Aliás, quando se afirma atacar a metodologia da pesquisa em pauta, não se está a defender que o trabalho deva ser espancado ou estuprado.

Parece ser o caso de que o termo "atacar" bem poderia ser entendido pela maioria dos entrevistados como "censurar". Esta confusão poderia ter sido evitada se os pesquisadores fossem mais precisos e menos ambíguos na formulação das questões.

Porém, mesmo considerando que a maioria das pessoas entendeu o termo "atacar" no sentido de "praticar um ato de violência", mesmo assim, restaria profundamente incerto os limites da violência com a qual concorda o entrevistado. A própria L. n. 11.340/2006, enumera várias formas de violência que podem ser compreendidas como "atacar":

Art. 7º  São formas de violência doméstica e familiar contra a mulher, entre outras:

I - a violência física, entendida como qualquer conduta que ofenda sua integridade ou saúde corporal;

II - a violência psicológica, entendida como qualquer conduta que lhe cause dano emocional e diminuição da auto-estima ou que lhe prejudique e perturbe o pleno desenvolvimento ou que vise degradar ou controlar suas ações, comportamentos, crenças e decisões, mediante ameaça, constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, vigilância constante, perseguição contumaz, insulto, chantagem, ridicularização, exploração e limitação do direito de ir e vir ou qualquer outro meio que lhe cause prejuízo à saúde psicológica e à autodeterminação;

III - a violência sexual, entendida como qualquer conduta que a constranja a presenciar, a manter ou a participar de relação sexual não desejada, mediante intimidação, ameaça, coação ou uso da força; que a induza a comercializar ou a utilizar, de qualquer modo, a sua sexualidade, que a impeça de usar qualquer método contraceptivo ou que a force ao matrimônio, à gravidez, ao aborto ou à prostituição, mediante coação, chantagem, suborno ou manipulação; ou que limite ou anule o exercício de seus direitos sexuais e reprodutivos;

IV - a violência patrimonial, entendida como qualquer conduta que configure retenção, subtração, destruição parcial ou total de seus objetos, instrumentos de trabalho, documentos pessoais, bens, valores e direitos ou recursos econômicos, incluindo os destinados a satisfazer suas necessidades;

V - a violência moral, entendida como qualquer conduta que configure calúnia, difamação ou injúria.

Porém, os pesquisadores, indevidamente, consideram que o verbo "atacar" é um sinônimo de agressão sexual e sustentam que a maioria dos entrevistados concorda que uma mulher vestindo roupas provocantes mereceria o estupro. Uma conclusão completamente divorciada das respostas coletadas.

Aliás, tal interpretação de "atacar" como "estuprar" parece ser demasiado contraditória quando verificados outras respostas na própria pesquisa:

a)  91,4% concordam que o homem que bate na esposa deve ir para a cadeia;

b) 82,1% discordam que a mulher que apanha em casa deve ficar quieta para não prejudicar os filhos;

c) 68,1% reconhecem que é uma violência falar mentiras sobre uma mulher para os outros;

d) 89,2% discordam que o homem pode xingar ou gritar com a própria esposa.

Destaca-se que noutro estudo, quando perguntado ao brasileiro "se uma pessoa foi infiel ao seu(ua) parceiro(a) ele(a) mereceria apanhar" a discordância absoluta alcançou notáveis 70,9%. Ninguém concordou totalmente com tal licença à violência.

Ou seja, considerando respostas de outras questões e outras pesquisas, existe um repúdio à violência contra a mulher, inclusive àquelas agressões verbais e morais. Nestes termos, não parece ser razoável supor que as mesmas pessoas que repudiam a violência contra a mulher nestas questões, defendam o estupro noutra.

Parece ser certo que se o termo "atacar" fosse substituído pelo "estuprar" o número de concordantes seria significativamente menor. Lamentavelmente não seria nulo.


SE AS MULHERES SOUBESSEM COMO SE COMPORTAR, HAVERIA MENOS ESTUPROS

Talvez um dos pontos da pesquisa que mais gerou polêmica, resume-se a este. Segundo os pesquisadores, tais números permitiriam a seguinte conclusão:

"A culpabilização da mulher pela violência sexual é ainda mais evidente na alta concordância com a ideia de que 'se as mulheres soubessem como se comportar, haveria menos estupros' (58,5%). Por trás da afirmação, está a noção de que os homens não conseguem controlar seus apetites sexuais; então, as mulheres, que os provocam, é que deveriam saber se comportar, e não os estupradores. A violência parece surgir, aqui, também, como uma correção. A mulher merece e deve ser estuprada para aprender a se comportar. O acesso dos homens aos corpos das mulheres é livre se elas não impuserem barreiras, como se comportar e se vestir 'adequadamente'".

Mais uma vez, respeitosamente, discordo das conclusões dos pesquisadores, uma vez que é verdadeiro que se as mulheres soubessem se comportar, de fato, existiriam menos estupros. Calma, calma, calma. Antes do apedrejamento, deixem-me explicar minhas razões.

Segundo estudos de vitimologia, é possível destacar 10 (dez) fatores que implicam em diferentes níveis de vitimização ou seja, 10 (dez) diferentes componentes que, conforme o caso, aumentam ou diminuem os risco de tornar-se em uma vítima. São eles, sinteticamente:

a) Oportunidade: que é intimamente relacionada com as características dos potenciais alvos, especialmente suas atividades e comportamento;

b) Fatores de risco: particularmente aqueles elementos demográficos, como idade, gênero, local de residência, ausência de protetores, etc;

c) Ofensores motivados: Quando o criminoso ataca um particular grupo de vítimas, como é o caso de crimes motivados por discriminação de gênero ou por racismo;

d) Exposição: A colocação em situações de proximidade com potenciais criminosos ou em situações de periculosidade aumentam as possibilidades de vitimização;

e) Associação: A relação pessoal, profissional ou social com potenciais criminosos aumenta a chance de tornar-se uma vítima por proximidade;

f)  Locais e horários perigosos: As possibilidades de se tornar uma vítima também decresce ou se incrementa conforme as condições de tempo e lugar. Frequentar determinados espaços públicos em determinados horários pode, muito bem, aumentar as chances de vitimização;

g) Comportamentos perigosos: Isso porque certos comportamentos, como a provocação, podem implicar em aumento do risco de violenta vitimização enquanto outros comportamentos como negligência podem aumentar as possibilidades de vitimização patrimonial, por exemplo;

h) Atividades de alto risco: Por exemplo, certas ocupações, como a prostituição, carregam em si um alto potencial para a criminalização violenta. Policiais, também, estão expostos aos riscos inerentes à atividade;

i) Comportamento defensivo: A tomada de precauções relativamente simples podem muito bem diminuir as chances de vitimização. Andar em grupo, proficiência em métodos de defesa pessoal, podem diminuir as possibilidades de agressão;

h)  Marginalização: A marginalização de determinados grupos sociais, especialmente minoritários, podem deixar os indivíduos pertencentes a tais categoriais, especialmente expostos a possibilidades de vitimização.

Para melhor ilustrar as variáveis acima, tomemos como exemplo os cuidados recomendados na prevenção de crimes patrimoniais. Neste caso pouquíssimos desafiariam o bom senso e a prudência de alguns conselhos básicos como não deixar bolsas ou mochilas desacompanhadas, usar cadeados em bicicletas ou evitar ostentar um celular em certas localidades e em determinados horários. Tratam-se todos os conselhos acima de diretrizes comportamentais que qualquer pessoa pode tomar para si com o escopo de diminuir as possibilidades de vitimização.

Aliás, é de se notar que em um país de "espertos", não raro, as vítimas são reconhecidas nalguns casos como "trouxas" ou "otários". Chama-se a atenção para aquela pessoa que deixa o celular completamente sem vigilância em uma mesa de bar enquanto vai ao banheiro. As chances de ser vitimado por um crime patrimonial são sensivelmente incrementadas pelo próprio comportamento negligente do proprietário. Não é raro nestes casos, quando eventualmente ocorre o furto, que inclusive amigos da vitima a censurem por ter sido tão descuidada. Evidentemente, isso não significa que a pessoa mereceu ser vitimada, porém, a falta de cuidado com seus próprios interesses é visto como uma ingenuidade censurável. Foi o que aconteceu, para destacar um caso de considerável repercussão, com Luciano Huck que foi assaltado quando trafegava em seu veículo usando um rolex. Muitos o criticaram por ostentar um relógio caríssimo em uma cidade deveras perigosa. Não se trata de afirmar que a culpa é da vítima. A censura aqui é por não proceder a cuidados elementares que poderiam preservar não somente o patrimônio, mas também a integridade física e até a vida do vitimado.

Nestes casos, portanto, dizer que eles mereceram o acontecido não implica dizer que existiria um dever moral de praticar crimes contra estas pessoas. Não se trata de desculpar o malfeitor, mas de criticar a vítima por não reconhecer a importância de preservar seus próprios interesses.

A ideia de que é possível diminuir o perfil de vítima é aplicado perfeitamente na prevenção de crimes sexuais. Nestes termos e observando as variáveis acima, é de se reconhecer que alterando determinados comportamentos, qualquer pessoa, homem ou mulher, pode diminuir seu perfil de vítima, mitigando sua vulnerabilidade. Nestes termos, saber se comportar é, justamente, não se comportar de forma a aumentar as possibilidades de vitimização.

Exemplos de comportamentos que diminuem as possibilidades de vitimização sexual da mulher:

a) Não deixar copos de bebidas desacompanhados ou não aceitar bebidas de estranhos, evitando o famigerado estupro por violência química, vulgarmente conhecido por "boa noite, cinderela";

b) No caso de menores de idade, especialmente crianças, não conversar ou confiar em estranhos, seja na rua, seja na rede mundial de computadores. Tal comportamento defensivo evitaria muitas situações de crimes de estupro de vulneráveis e de exposição de imagens eróticas;

c) Zelar pela privacidade evitando expor informações de sua vida particular em redes sociais. No caso de ofensores motivados, a internet por funcionar como uma importante fonte de informações que aumentam o perfil de vulnerabilidade do alvo;

d) Evitar situações nas quais permanece-se sozinha com pessoas desconhecidas em ambientes fechados ou locais ermos; e

e) No caso de assédio sexual no ambiente de trabalho, é recomendado, nalguns estudos sobre prevenção, que a vítima evite roupas reveladoras ou impróprias ao desempenho da atividade profissional. 

f) Cursos de autodefesa provaram-se experiências bastantes eficazes para evitar a consumação de agressões sexuais. Por certo, aulas de autodefesa são uma mudança comportamental, mas acho difícil argumentar que ensinar alguém a chutar os testículos de um estuprador seja um reflexo de uma mentalidade machista.

É evidente que a apresentação sintética de algumas precauções, como são as citadas anteriormente, não esgotam o rol de possibilidades defensivas para diminuir as possibilidades de ser vitimada por um crime sexual, nem mesmo evitam por completo a possibilidade de um estupro, especialmente considerando crimes passionais ou um agressor altamente motivado. Também é certa a injustiça de um mundo no qual uma pessoa é forçada a mudar sua rotina para evitar ser brutalizada por criminosos. Entretanto, deixar de reconhecer que vivemos numa sociedade perigosa e não tomar providências simples e eficazes que aumentam a segurança pessoal é de uma ingenuidade ou temeridade sem tamanho. Nesta esteira, trata-se de um enorme desserviço à prevenção dos crimes sexuais aquelas ações e discursos que afirmam que a mulher não deve alterar seu comportamento, pois tal discurso, em verdade, afirma que a mulher não deve se preocupar e/ou tomar providências contra os horrores que podem, injustamente, lhe atingir.

Em suma: A modificação da rotina e do comportamento de uma pessoa pode diminuir a vulnerabilidade individual e, por consequência, mitigar as possibilidades de tornar-se vítima. Neste sentido, portanto, é correto afirmar que se a mulher souber se comportar, o número de estupros possivelmente diminuirá.

O BRASILEIRO É TOLERANTE COM O ESTUPRO?
Ao afirmar que o brasileiro é particularmente tolerante com o estupro, os pesquisadores ignoram ou desconhecem vários estudos que indicam que este é o crime mais repudiado por nossa população.

Um estudo da USP (2010) é muito esclarecedor neste sentido:

a) Em resposta múltipla - permitindo mais de uma menção - e espontânea à pergunta sobre quais crimes mais graves merecem sempre punição, 63,7% dos entrevistados indicaram o estupro. Para efeitos de comparação, aqueles que indicaram o homicídio não excedem 40,8%.

b) Para os entrevistados (40%), o crime de estupro é tão grave que justifica inclusive a tortura de suspeitos.

c) Nesta mesma entrevista, quando perguntado qual dos crimes mereceria a pena de morte, o estupro ficou em primeiro lugar. Segundo o estudo "em geral em todas as cidades as penas mais severas são aquelas atribuídas aos estupradores, seguidos dos terroristas".

Além disso, é um fato notório que nos estabelecimento penitenciários não há criminoso mais desprezado e odiado do que o estuprador. No caso de condenação por tal crime, é inclusive de se destacar que a vida do preso corre severo risco se não for apartado da população geral.

CONCLUSÃO
O estudo do IPEA padece de graves problemas, especialmente na formulação das questões, análise e interpretação dos dados. Suas conclusões são ideologicamente orientadas, divorciadas e conflitantes com os dados coletados.

Ainda que ninguém mereça uma pesquisa com tantas e graves falhas, destaca-se que tais problemas não implicam que a violência contra a mulher não exista, que ela seja menos do que hedionda ou que não seja importante a implementação de políticas públicas com o fito de prevenir e reprimir a violência de gênero.

De positivo, desta pesquisa, somente destaca-se a mobilização para lembrar o que ninguém deveria esquecer: #NinguemMereceSerEstuprado.


sexta-feira, 28 de março de 2014

STF: Decisão remete o julgamento de Eduardo Azeredo para a primeira instância da Justiça mineira


STF decide que ex-deputado Eduardo Azeredo deve ser julgado na 1ª instância 

O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que os autos da Ação Penal (AP) 536, ajuizada contra o ex-deputado federal Eduardo Azeredo, devem ser remetidos para a primeira instância da Justiça de Minas Gerais. A decisão ocorreu na sessão plenária realizada na tarde desta quinta-feira (27) quando os ministros analisaram uma questão de ordem a fim de saber se, com a renúncia ao cargo de deputado federal, Azeredo deixaria de ter foro por prerrogativa de função, não cabendo mais ao Supremo julgá-lo.

Segundo os autos, o ex-parlamentar e outros réus foram denunciados pelo procurador-geral da República pela suposta prática dos crimes de peculato e lavagem de dinheiro, em concurso material e em concurso de pessoas. Houve o desmembramento do processo no Supremo e a AP 536 passou a tramitar apenas contra Eduardo Azeredo, por ele ser deputado federal à época.

A denúncia foi recebida pelo Supremo no dia 3 de dezembro de 2009. Posteriormente, o réu foi interrogado e as testemunhas de acusação e defesa foram ouvidas. Em 7 de fevereiro em 2014, o procurador-geral da República apresentou alegações finais e, reiterando os termos da denúncia, pediu a aplicação de uma pena de 22 anos de prisão. No dia 19 de fevereiro de 2014, o réu comunicou ao Supremo que havia renunciado ao mandato de deputado.

Competência
O relator, ministro Luís Roberto Barroso, lembrou que desde 1999 o entendimento reiterado do STF é no sentido de que havendo a renúncia, a qualquer tempo e por qualquer razão, a competência para julgar o réu passa a ser das instâncias inferiores. Segundo ele, houve uma exceção a essa jurisprudência com a AP 396, em que se constatou abuso de direito e fraude processual, uma vez que o réu Natan Donadon renunciou ao cargo após o processo ter sido incluído na pauta para julgamento do Plenário da Corte. Na ocasião, o STF entendeu que a renúncia de mandato é ato legítimo, porém não desloca competência tendo em vista que não cabe ao réu escolher por qual instância será julgado.

Em seu voto, o relator entendeu que Azeredo deve ser submetido à regra geral que vigorou até o momento, porque considera “indevida a mudança da regra do jogo a essa altura”. “Estamos no âmbito do processo penal e nesse domínio a preservação das regras do jogo é de capital importância, sob pena de vulnerar a segurança jurídica e o processo legal”, ressaltou.

O ministro informou que, no caso concreto, a renúncia ocorreu no momento em que se encontrava aberto o prazo para a apresentação de razões finais pela defesa. “Portanto, a instrução processual foi encerrada alguns dias após a renúncia”, disse. “A partir daí, faltaria a elaboração dos votos pelo relator, pelo revisor e depois se pediria dia para julgamento do Plenário”, completou. Para o relator, a situação do réu não se equipara à AP 396, quando a renúncia de Donadon se deu na véspera do julgamento.

Também ressaltou que nesta ação penal não há risco de prescrição da pena in abstrato. “Se os autos forem ao juiz de primeiro grau, ele já estará em condições de sentenciar”, afirmou. Dessa forma, o relator entendeu que no caso concreto deveria ser preservada a jurisprudência consolidada da Corte, por isso votou pelo declínio da competência do Supremo a fim de que ocorra a remessa dos autos à primeira instância da Justiça mineira. Ele foi seguido pela maioria do Plenário, vencido o ministro Joaquim Barbosa.

Proposta de nova regra
O ministro Roberto Barroso propôs nova regra para situações em que houver renúncia de parlamentar a ser julgado pelo Supremo. “Temos a necessidade de estabelecer um critério geral, porque até que momento um ato de vontade do parlamentar deve ter o condão de mudar a competência do STF?”, indagou o relator.

Ele sugeriu o recebimento da denúncia como marco temporal para a continuidade de ação penal contra parlamentar que renuncie ao cargo, utilizando como fundamento o artigo 55, parágrafo 4º, da Constituição Federal. “A renúncia, após o recebimento da denúncia, não retira a competência do Supremo”, entendeu o ministro Barroso, ao ressaltar que existem outros momentos possíveis como o final da instrução processual ou a inclusão do processo em pauta.

Outra proposta apresentada foi a da ministra Rosa Weber, que sugeriu o encerramento da instrução processual como marco para a renúncia afastar a competência do STF. Já os ministro Dias Toffoli pronunciou-se no sentido de que os autos não deveriam ser enviados às instâncias inferiores quando o relator já tiver concluído seu voto e liberado o processo para o revisor. Ainda em relação à proposta de se estabelecer uma regra para essas situações, o ministro Celso de Mello ponderou que o critério deve ser aplicado caso a caso.

Não houve deliberação do Plenário, contudo, em relação a esse ponto. O tema deverá ser objeto de discussão oportunamente.

Leia o voto do Min. Rel. Roberto Barroso.

 

quinta-feira, 27 de março de 2014

STF: Difamação e injúria face a imunidade parlamentar


Plenário julga improcedente acusação contra Garotinho por crimes de difamação e injúria

Por maioria de votos, o Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF), em sessão realizada nesta quinta-feira (27), julgou improcedente a acusação no Inquérito (INQ) 3677, movido contra o deputado federal e ex-governador do Rio de Janeiro Anthony Garotinho pela suposta prática de injúria e difamação (artigos 139 e 140 do Código Penal) contra um então candidato à Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro. Para a maioria dos ministros, o parlamentar agiu protegido pela imunidade parlamentar, prevista no artigo 53 da Constituição Federal.

Em maio de 2013, o Ministério Público Federal apresentou denúncia contra Anthony Garotinho, apontando que, em 2011, o parlamentar teria, em três posts publicados no seu blog na internet, injuriado e difamado o então candidato a deputado estadual André Lazaroni de Morais, imputando a ele suposta aliança com os líderes do tráfico de drogas do morro da Rocinha, na capital fluminense.

Da leitura do blog, disse o procurador-geral da República, ficou clara a intenção de Garotinho de difamar a reputação de Lazaroni, ultrapassando em muito o limite do direito de informar e da imunidade parlamentar. Com esse argumento, o procurador pediu o recebimento da denúncia.

Imunidade
A defesa de Garotinho pediu a improcedência completa da acusação, na forma do artigo 6º da Lei 8.038/1990 (lei que rege a tramitação de processos no STF), dizendo que seu cliente apenas exerceu o direito de informar a população, e que na condição de deputado federal, estava protegido pela imunidade parlamentar, que se estenderia a todas as atividades desenvolvidas em função de seu mandato. No blog, frisou, Garotinho estaria protegido pela liberdade de manifestação do pensamento e opinião. Como homens públicos, devem suportar críticas, disse o defensor.

O advogado ressaltou que tudo que foi narrado por Garotinho havia sido noticiado pela imprensa do Rio. Eram, segundo a defesa, fatos notórios, comentados abertamente pelos maiores veículos de imprensa do país.

Maioria
O primeiro a votar pela improcedência da acusação foi o ministro Teori Zavascki. Para ele, a definição do campo de proteção da imunidade parlamentar, previsto no artigo 53 da Carta da República, não se faz isolado e abstratamente, mas com base em fatos concretos. Nesse sentido, Teori Zavascki afirmou entender que tanto o denunciado quanto a vítima são protagonistas no cenário político do Rio de Janeiro, sendo adversários notórios. Assim, a conclusão a que se chega é que nos citados posts publicados contra Lazaroni, o acusado agiu ligado ao exercício dessas atividades políticas e, portanto, protegido pela imunidade constitucional, prestigiada pela jurisprudência da STF.

Também votaram nesse sentido, acompanhando o ministro Teori Zavascki, os ministros Dias Toffoli, Gilmar Mendes, Celso de Mello e o presidente da Corte, ministro Joaquim Barbosa.

Difamação
A relatora do inquérito, ministra Cármen Lúcia, votou pelo recebimento da denúncia apenas quanto ao crime de difamação, afirmando entender que Garotinho extrapolou a mera crítica a Lazaroni. Segundo ela, o exercício da liberdade de informação e crítica não permite a postagem de ofensas graves contra terceiros, sejam pessoas públicas ou não. “É necessário que se mantenha, sempre, a ética e o decoro”, disse a ministra.

Segundo a relatora, o teor das postagens no blog ultrapassaria a mera repetição das notícias publicadas na imprensa. Quanto à alegada imunidade parlamentar, prevista no artigo 53 da Constituição Federal, a ministra disse que não se estenderia para toda e qualquer manifestação do parlamentar, principalmente quando a manifestação não tiver relação com o cargo exercido.

A relatora foi acompanhada pela ministra Rosa Weber e pelo ministro Marco Aurélio.

TJMG: A previsibilidade do resultado morte impõe que todos os coautores de um roubo respondam por eventual latrocínio



TJ mantém condenação de trio que matou atriz durante assalto

Condenados em Primeira Instância, os réus recorreram; dois deles pediram redução da pena e um pediu absolvição.

O Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) manteve a condenação por latrocínio de três homens que assassinaram a atriz C.B.P., de 32 anos de idade, durante um assalto à casa dela, em 7 de outubro de 2012, no bairro Santa Lúcia, região Centro-Sul de Belo Horizonte.

Em julho de 2013, os três acusados foram condenados em Primeira Instância. G.M.H. foi condenado a 33 anos, 7 meses e 6 dias de reclusão; L.H.S.P.,  a 24 anos de reclusão; e C.E.S., a 28 anos e 9 meses de reclusão, todos em regime inicial fechado.

O Ministério Público recorreu, pedindo reconhecimento da agravante de reincidência em relação ao réu G., com consequente aumento da pena. Os três réus também recorreram. C. pediu absolvição de todos os delitos, alegando falta de prova em relação à sua participação nos crimes. L. pediu a desclassificação do crime de latrocínio para o de roubo qualificado. Também requereu que não fosse considerada a majorante de restrição de liberdade das vítimas e que fosse aplicada a atenuante de confissão e o reconhecimento de crime único.

O réu G., por sua vez, pediu, entre outros pontos, o reconhecimento de crime único, a redução das penas-base aplicadas, a atenuante da confissão espontânea e que fosse decotada da pena a agravante de restrição da liberdade das vítimas. 

A apelação criminal foi julgada pela 3ª Câmara Criminal do TJMG. A desembargadora relatora, Maria Luíza de Marilac, observou que a materialidade e a autoria dos crimes, pelos três réus, estavam suficientemente comprovadas por várias provas, como reconhecimento dos réus por duas das vítimas, o irmão da atriz, M.B.P., e a namorada dele, A.S.M., que estavam na casa, tiveram objetos pessoais roubados e a liberdade restringida, durante o assalto; por boletim de ocorrência; auto de apreensão; e os laudos de necropsia, de levantamento do local, de análise de DNA e de CD contendo gravação do Disque 190 e 193, entre outros documentos.

O concurso formal de crimes restou devidamente caracterizado também, julgou a desembargadora relatora, pois “mediante uma única ação, os apelantes vulneraram três patrimônios distintos (as vítimas C., M. e A.), o que impede o reconhecimento de crime único”.

Risco assumido.

A desembargadora relatora declarou: “Destarte, pouco importa que a vítima tenha sido atingida por disparos de arma de fogo desferidos exclusivamente por G. Havia entre todos os acusados o vínculo psicológico para a prática do roubo. O desdobramento causal mais grave era previsível e o risco foi por eles assumido, pois quem pratica um roubo com emprego de armas de fogo em perfeito estado de funcionamento sabe seguramente que, como consequência da violência e grave ameaça empregada, pode produzir o resultado mais grave. O dolo de causar violência com o resultado morte está na linha de previsibilidade na conduta de quem resolve cometer roubo com emprego de arma de fogo”.

Na avaliação da desembargadora relatora, “sendo a violência parte integrante e fundamental do tipo penal do latrocínio, conclui-se que todos os agentes devam responder pelo resultado mais gravoso, pouco importando a circunstância de existirem diferentes tipos de atuações no momento do cometimento do crime, notadamente se considerado que para o bom andamento e sucesso da empreitada criminosa, afigurava-se necessária a divisão de tarefas entre eles. Aquele que se associa a comparsa para a prática de roubo assume o risco de responder como coautor de latrocínio se da violência resultar lesões graves ou a morte da vítima, independentemente de não ter sido o autor do disparo ou de sua participação na execução do delito ter sido menos intensa”.

Tendo em vista os papéis que cada réu desempenhou nos crimes e aspectos como confissão espontânea, circunstâncias judiciais desfavoráveis, como reincidência, restrição de liberdade das vítimas, concurso formal de crimes, entre outros pontos, recalculou as penas dos réus. Com base em atenuantes e agravantes, a pena de G. permaneceu fixada em 33 anos, 7 meses e 6 dias de reclusão e a de L. em 24 anos. A pena de C. foi reduzida para 26 anos e 4 meses, pois a desembargadora considerou que o réu, embora tenha se retratado em juízo, confessou a prática do delito durante a fase de inquérito. Reconheceu em seu favor, assim, a atenuante da confissão espontânea. 

Os desembargadores Antônio Carlos Cruvinel e Paulo Cézar Dias votaram de acordo com a relatora.

FONTE: ASSESSORIA DE IMPRENSA DO TJMG.

Para ler o acórdão: aqui.

quarta-feira, 26 de março de 2014

STF: Caso de pedido de extradição formulado por dois países


2ª Turma analisa processo de acusado de tráfico com extradição requerida por dois países


Por votação unânime, a Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) concedeu parcialmente, nesta terça-feira (25), a extradição (EXT 1276) do cidadão bósnio Bozidar Ratkovic, ou Goran Simic, ou Slobodan Njegic, requerida pelo governo da Itália, para que ele responda perante a Justiça daquele país pelo crime de tráfico de entorpecentes.


O pedido foi deferido parcialmente porque o Supremo já havia concedido em setembro de 2012 a extradição do mesmo cidadão à Argentina, para que lá responda pelo crime de tráfico e associação com o tráfico. De acordo com o relator do processo, ministro Gilmar Mendes, em caso de pedidos de extradição por crimes diversos, porém com gravidade semelhante, cabe preferência ao país que primeiro formular o pedido, conforme preconiza o artigo 79, parágrafo 1º, inciso II, do Estatuto do Estrangeiro (Lei 6.815/1990). Ele relatou que o parecer da Procuradoria Geral da República nos autos foi pelo reconhecimento da prejudicialidade da extradição e citou precedentes do Supremo nesse sentido.


Contudo, o relator se posicionou por solução diversa para este caso. Embora a Argentina tenha formulado pedido (EXT 1250) em primeiro lugar, para o ministro a interpretação daquela regra do Estatuto do Estrangeiro “não indica a impossibilidade de um novo pedido de extradição quando os crimes forem diversos e praticados em países diferentes”. Destacou também que o artigo 91 do estatuto permite a reextradição desde que a entrega do extraditando a outro país ocorra com o expresso consentimento do Estado brasileiro. Assim, não haveria vedação de Bozidar ser entregue para a Itália após cumprir pena na Argentina, se lá for condenado, ou se absolvido. Ou na hipótese de a Argentina desistir de efetivar a extradição. 

Em qualquer das hipóteses, o ministro ressaltou que a extradição fica condicionada ao cumprimento da pena imposta ao extraditando no Brasil. No caso, ele foi condenado à pena de 13 anos, 7 meses e 24 dias pelo juízo da 2ª Vara Federal do Rio Grande do Sul.

segunda-feira, 24 de março de 2014

STJ: Autorização para interdição de psicopata que aos 16 anos matou a própria família




A possibilidade de interdição civil de pessoa diagnosticada como sociopata ou psicopata é talvez um dos maiores dilemas que se coloca em relação ao instituto da interdição, porque confronta os limites necessariamente rígidos das possibilidades de interdição civil com uma perspectiva sombria de agressão social iminente. A ponderação é da ministra Nancy Andrighi, feita em julgamento realizado na Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ).

A Turma analisou um recurso especial do Ministério Público (MP) de Mato Grosso, que ajuizou ação de interdição de um homem que, aos 16 anos de idade, matou a facadas a mãe de criação, o padrasto e o irmão de três anos, na cidade de Cáceres. Ele recebeu a medida socioeducativa de internação por três anos. A internação acabou e era preciso decidir o destino do jovem.

O pedido de interdição feito pelo MP foi negado em primeira e segunda instância. Laudos médicos apontam que o jovem sofre de transtorno da personalidade não especificado. Para os magistrados de Mato Grosso, essa condição não integra as hipóteses que permitem a interdição e curatela descritas no inciso III do artigo 1.767 do Código Civil de 2002 – deficientes mentais, ébrios habituais e viciados em tóxicos. Consideraram que o jovem tem capacidade para realizar atos da vida civil.

O MP recorreu contra essa decisão e o STJ deu provimento ao recurso para decretar a interdição requerida. Seguindo o voto da ministra Nancy Andrighi, relatora, os ministros consideraram que a sociopatia, quando há prévia manifestação de violência por parte do sociopata, colocando em risco a própria vida e a de outros, autoriza a curatela do indivíduo para que ele possa ter efetivo acompanhamento psiquiátrico, de forma voluntária ou coercitiva.

Medicina
Para decidir o caso, a ministra Nancy Andrighi mergulhou em pesquisas médicas acerca do comportamento humano que efetivamente caracteriza um sociopata ou psicopata. Segundo ela, os estudiosos do tema são unânimes ao afirmar que, como se trata de uma alteração congênita, os portadores desse distúrbio não respondem a tratamentos com medicamentos nem psicoterapia.

A relatora constatou que a psicopatia está na zona fronteiriça entre a sanidade mental e a loucura, onde os instrumentos legais disponíveis mostram-se ineficientes, tanto para a proteção social como para a própria garantia de vida digna aos sociopatas.

Por essa razão, ela entende que os magistrados devem buscar alternativas dentro do arcabouço legal para, de um lado, não vulnerar as liberdades e os direitos constitucionalmente assegurados a todos e, de outro, não deixar a sociedade refém de pessoas incontroláveis nas suas ações, que tendem à recorrência criminosa.

“Na atual evolução das ciências médicas, não há controle medicamentoso ou terapêutico para essas pessoas, e a reincidência comportamental é quase uma certeza”, afirmou Nancy Andrighi.

Legislação
A relatora reconhece que o artigo 1.767 do Código Civil sujeita à interdição os deficientes mentais, ébrios e viciados em tóxicos. Ela entende que a possibilidade de interdição de sociopatas que já cometeram crimes violentos deve ser analisada sob o mesmo enfoque desse dispositivo.

A apreciação da possibilidade de interdição civil, quando diz respeito a sociopatas, segundo Nancy Andrighi, pede medida inovadora que considere os interesses do interditando, suas possibilidades de inserção social e o respeito à sua dignidade pessoal, e, por outro lado, o interesse coletivo, que é a proteção dos indivíduos.

Ela lembrou que o Decreto 24.559/34, que tratava da assistência e proteção à pessoa e aos bens dos psicopatas, já previa a internação compulsória dessas pessoas. A Lei 10.216/01 passou a permitir a internação psiquiátrica compulsória determinada pela Justiça, com base em laudo médico que a justifique.

Caso a caso
Estudo de um médico psiquiatra, destacado pela relatora em seu voto, aponta que os crimes espetaculares não são a regra nas atuações sociais dos psicopatas. Por outro lado, o cometimento de desvios éticos, além de uma grande variedade de pequenos ilícitos criminais e civis, são a tônica do comportamento social daqueles que têm uma personalidade psicopática.

Diante do impossível controle da psicopatia em suas diversas manifestações e da predisposição a repetir comportamentos antissociais, Nancy Andrighi entendeu que a interdição está associada à necessidade de albergar o sociopata em rede de proteção social multidisciplinar, que inclui um curador designado, o estado-juiz, o Ministério Público, profissionais da saúde mental e outros mais que se façam necessários.

Por fim, a ministra ressaltou que a interdição de sociopata deve ser analisada caso a caso. A constatação da sociopatia não implicará necessariamente a interdição do psicopata. Somente quanto evidenciado um histórico da prática de violência e desprezo pelas regras sociais é que fica afastada a tese de plena capacidade desse indivíduo.


Leia a decisão.