quinta-feira, 26 de fevereiro de 2015

CNJ: Corregedoria investigará o uso de bens apreendidos de Eike Batista


O uso de bens apreendidos pelo juiz Flávio Roberto de Souza, da 3ª Vara Federal Criminal do Rio de Janeiro será investigado pela Corregedoria Regional da Justiça Federal da 2ª Região. A Corregedoria Nacional de Justiça acompanhará a investigação. 

Ao tomar conhecimento, pela imprensa, do uso de um dos veículos apreendidos no caso do empresário Eike Batista, a corregedora nacional de Justiça, ministra Nancy Andrighi, entrou em contato com o presidente do Tribunal Regional Federal da 2ª Região e com a corregedoria regional, quando foi informada de que um processo de sindicância fora instaurado pela corregedoria regional.

A apuração dos fatos e demais medidas ficarão, portanto, a cargo daquela corregedoria, porém a corregedora nacional de Justiça acompanhará o andamento do processo e seu resultado.


TJGO: Durante visita de magistrado em escola, aluna denuncia o padrasto e a mãe por estupro de vulnerável.


O juiz Inácio Pereira da Siqueira, da comarca de Jataí, condenou a 9 anos e 4 meses de reclusão, em regime inicialmente fechado, pelos crimes de estupro de vulnerável e omissão, a mãe e o padrasto da menor V.C.M.G. Os abusos foram narrados por uma aluna da Escola Rural Professor Chiquinho, localizado no município de Jataí, quando o juiz da Vara da Infância e Juventude da comarca, Sérgio BritoTeixeira e Silva, visitou as crianças durante a realização do Programa Justiça Educacional do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás.

A menor, estudante da escola, narrou ao magistrado que seu padrasto abusava sexualmente de sua irmã e que a mãe “tinha conhecimento e não fazia nada”. Em razão disso, foramtomadas medidas investigatórias que resultaram na sentença condenatória.

Consta dos autos que o padrasto constrangia a vítima para que ela permitisse que ele passasse seu órgão genital na nádega dela, além de forçá-la a deixar que ele tocasse em suas partes íntimas. “O acusado manteve união estável com a mãe da menor por cerca de oito anos e ela sabia dos abusos cometidos contra sua filha, sendo conivente com tais atos”, afirmou a denúncia.

Na sentença, o juiz Inácio Siqueira afirmou que não há dúvidas sobre a materialidade do crime. Entre outras provas, há o próprio relato da vítima, tanto na polícia quanto em juízo. “Quanto à autoria, o conjunto probatório que consta do processo conduz à certeza de que o padrasto, de forma efetiva, abusou sexualmente da menor. No mesmo raciocínio, verifico, sem sombra de dúvida, que a autoria também se faz certa quanto à acusação de que a mãe, mesmo sabendo das agressões perpetradas por seu amásio, preferiu ignorá-las, emprestando seu apoio para tais atos criminosos”, frisou.

O magistrado observou ainda que a mãe foi alertada várias vezes quanto aos acontecimentos, mas preferiu acobertar os atos animalescos do acusado. “Era sua obrigação legal, moral e humana velar pela integridade, pela dignidade e pelo bem estar de sua filha. Devia e podia agir para impedir o resultado e não fez”, pontuou. O processo de guarda das crianças está em tramitação na Vara da Infância e Juventude de Jataí. As meninas não estão em poder da mãe. 



TRF 1ª Região: O uso de imagem sem autorização viola a dignidade da pessoa humana


As filmagens captadas por câmeras de segurança instaladas no interior de agência bancária são confidenciais, constituindo abuso divulgá-las sem autorização da pessoa objeto da filmagem ou sem que haja decisão judicial permitindo. Com essa fundamentação, a 6ª Turma do TRF da 1ª Região reformou sentença de primeira instância para condenar a Caixa Econômica Federal (CEF) a pagar indenização, a título de danos morais, no valor de R$ 10 mil a cliente que teve imagens suas captadas pelo sistema de segurança do banco divulgadas a terceiros sem seu consentimento.

O cliente entrou com ação na Justiça Federal requerendo a condenação da instituição financeira ao pagamento de indenização por danos morais em virtude da divulgação indevida de suas imagens. Em primeira instância, o pedido foi julgado improcedente, razão pela qual recorreu ao TRF1 objetivando a reforma da sentença.

O apelante alegou que o gerente da CEF cedeu, sem sua autorização, filmagem para outro cliente na qual aparecia com o filho no interior da agência bancária. Argumentou que o gerente em questão o acusou de ter efetuado saques indevidos na conta-corrente de terceiros. Essa acusação gerou uma ação penal por crime de furto em conta corrente alheia, ocasião em que acabou inocentado por causa da fragilidade da prova produzida. “A conduta do gerente do banco lhe causou prejuízos de ordem moral”, ponderou. Por isso, requereu o devido ressarcimento.

As alegações foram aceitas pelo Colegiado. “A meu ver merece prosperar os pedidos contidos na apelação acerca da concessão de indenização por danos morais”, disse o relator, desembargador federal Kassio Nunes Marques, ao destacar que os fatos constantes dos autos revelam que as partes protagonizaram uma relação de consumo e que o real pedido do recorrente não versa sobre o mérito da ação criminal, mas, sim, sobre a ilegalidade na conduta da Caixa ao divulgar imagens do cliente captadas pelo sistema de segurança sem a devida autorização.

Segundo o magistrado, a legislação prevê que nenhum estabelecimento financeiro onde haja guarda de valores ou movimentação de numerário pode funcionar sem o devido sistema de segurança. “Contudo, o manejo das operações bancárias depende justamente do acesso irrestrito dos funcionários, no desempenho de suas funções. O desequilíbrio próprio dessa relação, constatado pela vulnerabilidade pendente sobre o consumidor, requer cuidados especiais e legais no trato do sigilo discutido nos autos”, explicou.

Nessa linha de raciocínio, de acordo com o relator, “cabe à CEF, como agente responsável pelo exercício e risco de sua atividade, a indenização por danos morais decorrente da falha na prestação do serviço bancário. Nesse sentindo, arbitro em R$ 10 mil o pagamento relativo à indenização por danos morais”.

A decisão foi unânime.
Processo n.º 0005166-47.2007.4.01.3801
Data do julgamento: 2/2/2015
Data de publicação: 18/2/2015


quarta-feira, 25 de fevereiro de 2015

CÂMARA DOS DEPUTADOS: Aprovada a criminalização da venda de bebida alcoólica para crianças e adolescentes


O Plenário da Câmara dos Deputados aprovou, nesta terça-feira (24), o Projeto de Lei 5502/13, do Senado, que tipifica como crime, no Estatuto da Criança e do Adolescente (8.069/90), a venda de bebidas alcoólicas a menores de 18 anos.

O texto prevê pena de detenção de dois a quatro anos e multa de R$ 3 mil a R$ 10 mil pelo descumprimento da proibição. A matéria será enviada à sanção presidencial.

Penalidades
Se o estabelecimento não pagar a multa no prazo determinado, poderá ser interditado até o pagamento.

A penalidade de detenção será aplicada ainda se a pessoa fornecer, servir, ministrar ou entregar de qualquer forma bebida alcoólica, ainda que gratuitamente, a criança ou adolescente.
Igual penalidade poderá ser aplicada em relação a outros produtos cujos componentes possam causar dependência física ou psíquica se a venda ou entrega ocorrer sem justa causa.

O texto é semelhante a outro (PL 6869/10), também do Senado, sobre o mesmo tema, que previa pena de detenção de seis meses a quatro anos e multa.

Contravenções Penais 
Atualmente, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) permite o enquadramento da conduta como contravenção penal, pois o estatuto não tipifica a penalidade para a proibição de venda da bebida, que já consta na Lei 8.069/90.

A Lei de Contravenções Penais (Decreto-lei 3.688/41) tipifica a venda de bebida alcoólica a menores com pena de prisão simples de dois meses a um ano ou multa.

A doutrina jurídica nacional diferencia a reclusão da detenção apenas quanto ao regime inicial de cumprimento da pena. Na primeira, ele pode começar com o regime fechado, semi-aberto ou aberto; enquanto na segunda alternativa não se admite o regime inicial fechado, que pode ocorrer apenas se a mudança for demonstrada necessária.

Já a prisão simples, existente apenas na lei de contravenções, deve ser cumprida sem rigor penitenciário e em estabelecimento especial ou seção especial de prisão comum, no regime semi-aberto ou aberto. Não há previsão do regime fechado em nenhuma hipótese para a prisão simples e o condenado fica sempre separado dos condenados a pena de reclusão ou de detenção.

Para eliminar o conflito entre as duas leis, o projeto aprovado revoga o dispositivo da Lei de Contravenções Penais sobre o tema.

Pena alternativa
A grande diferença, portanto, em relação à legislação atual é a tipificação da conduta como crime e a imposição de multa. Como a pena máxima é de quatro anos, seu cumprimento poderá ser feito de acordo com a lei de penas alternativas (9.714/98), que prevê a sua substituição por pena restritiva de direitos.

Legislação mais dura
Ao relatar a matéria pela comissão especial, o deputado Paulo Abi-Ackel (PSDB-MG) destacou que um dos fatores da criminalidade é o consumo de bebidas alcoólicas por crianças e adolescentes. “O projeto é um avanço na legislação sobre o tema para visar a melhor saúde, a melhor educação e o melhor ambiente para a família brasileira”, afirmou.

Para o deputado Vanderlei Macris (PSDB-SP), a Câmara precisa “travar uma verdadeira guerra contra a venda de bebidas alcoólicas para menores de 18 anos”.

Macris propõe que o Parlamento tenha a mesma iniciativa que resultou na restrição ao fumo. O deputado, que foi relator da Comissão Especial sobre o Consumo Abusivo de Bebida Alcoólica em 2012, criticou a falta de uma legislação mais dura quanto à propaganda e ao consumo excessivo.

Veja a íntegra do PL-5502/2013.


terça-feira, 24 de fevereiro de 2015

PERGUNTA & RESPOSTA: O médico que notifica aborto praticado por sua paciente está violando o sigilo profissional?


PERGUNTA
O médico que informa caso de aborto praticado por sua paciente pratica o delito de violação de segredo profissional nos termos do art. 154 do Código Penal?

O CASO
Mais um capítulo no interminável debate sobre a legalização do aborto teve lugar na cidade de São Bernardo do Campo (SP). Por ocasião do atendimento de uma gestante, o médico pressionou sua paciente até o ponto em que ela confessou a prática de um aborto ilegal que interrompeu gestação de quatro meses. O médico, desconsiderando o sigilo profissional que acobertava a relação com sua paciente, denunciou o ocorrido para a autoridade policial. A paciente foi autuada em flagrante delito e liberada após o pagamento de fiança. Ainda segundo a paciente, ela foi pressionada pelo médico a confessar o ocorrido e teria sido ridicularizada pelos policiais que atenderam a ocorrência (FONTE).

O acontecido acirrou os ânimos, tanto dos defensores da legalização do aborto quanto que oferecem oposição à ampliação dos casos de abortos legais no Brasil. Enquanto estes aplaudiram a atuação do médico, saudando sua atuação como um ato de defesa da vida intrauterina, aqueles pontuaram que a notificação do aborto pelo médico constituiu-se em gravíssimo atentado contra a privacidade da paciente e inadmissível ofensa ao sigilo profissional.

A FUNDAMENTAÇÃO DA RESPOSTA
O escopo deste artigo não é a revisão dos argumentos favoráveis ou contrários à ampliação das hipóteses legais de aborto. Pretende-se aqui a solução de outro problema. Quer-se saber: O médico estaria autorizado a violar a cláusula de sigilo profissional que protege seu paciente ou a conduta constitui-se em criminosa violação de segredo profissional?

Para responder a esta pergunta é indispensável a análise preliminar das normas profissionais que balizam o sigilo médico. Conforme dispõe o Código de Ética Médica:

É vedado ao médico:
Art. 73. Revelar fato de que tenha conhecimento em virtude do exercício de sua profissão, salvo por motivo justo, dever legal ou consentimento, por escrito, do paciente.
Parágrafo único. Permanece essa proibição: a) mesmo que o fato seja de conhecimento público ou o paciente tenha falecido; b) quando de seu depoimento como testemunha. Nessa hipótese, o médico comparecerá perante a autoridade e declarará seu impedimento; c) na investigação de suspeita de crime, o médico estará impedido de revelar segredo que possa expor o paciente a processo penal.

Soma-se ao disposto retromencionado as determinações constantes na Resolução CFM nº 1.605/2000:

Art. 1º - O médico não pode, sem o consentimento do paciente, revelar o conteúdo do prontuário ou ficha médica.
Art. 2º - Nos casos do art. 269 do Código Penal, onde a comunicação de doença é compulsória, o dever do médico restringe-se exclusivamente a comunicar tal fato à autoridade competente, sendo proibida a remessa do prontuário médico do paciente.
Art. 3º - Na investigação da hipótese de cometimento de crime o médico está impedido de revelar segredo que possa expor o paciente a processo criminal.
Art. 4º - Se na instrução de processo criminal for requisitada, por autoridade judiciária competente, a apresentação do conteúdo do prontuário ou da ficha médica, o médico disponibilizará os documentos ao perito nomeado pelo juiz, para que neles seja realizada perícia restrita aos fatos em questionamento.

A análise das normas do Conselho Federal de Medicina, tanto do Código de Ética Médica quanto da Resolução CFM nº 1605/2000, permitem o reconhecimento de três situações que autorizam/obrigam o médico a revelar informações que teve conhecimento em razão de sua profissão. Sinteticamente, são elas:

a) Revelação por motivo justo. Tratam-se dos casos nos quais a mantença do sigilo ofende os princípios da não-maleficência ou da beneficência. a.1.) A violação do princípio da não-maleficência ocorreria em situações na qual a continuidade do segredo importaria em risco intolerável para os interesses essenciais da própria paciente ou de outrem, o que se dá, p. e., em situações nas quais um paciente psiquiátrico relata uma crível ameaça à vida de terceiro; a.2.) Uma violação do princípio da beneficência ocorreria naqueles casos em que a continuação do sigilo, apesar de não colocar em risco interesses do paciente ou de outra pessoa, impediria a fruição de uma situação da qual acarretaria considerável incremento da qualidade de vida do paciente, sem, por outro lado, qualquer outro inconveniente. Trata-se, este caso, de situação na qual a revelação do sigilo é absolutamente desprovida de qualquer caráter gravoso e da qual as únicas consequências seriam benéficas ao paciente.

b) Revelação por consentimento escrito do paciente. O sigilo poderá ser dispensado por consentimento informado e expresso do paciente constante em documento escrito que explicite os limites de divulgação da condição sigilosa.

c) Revelação por decorrência de dever legal. Refere-se às situações nas quais a legislação brasileira excepciona o sigilo do profissional sanitário estabelecendo a obrigação de informar a autoridade competente de fatos considerados de interesse público.

Levando em consideração os fatos noticiados e confiando na correção do relato jornalístico, pode-se, de pronto, reconhecer que no caso em pauta, a divulgação do aborto praticado pela paciente não se enquadra em nenhumas das duas primeiras hipóteses de exceção ao sigilo profissional do médico. 

A revelação não ocorreu acobertada por justo motivo, pois o crime de aborto, já praticado, exauriu a potencialidade lesiva do fato, não restando ao médico a justificativa alicerçada no princípio da não-maleficência. Tampouco enquadra-se em situação autorizada pelo princípio da beneficência, porquanto, na medida que é incapaz de evitar o crime já realizado, somente expôs a paciente a severas consequências jurídicas na seara penal. Dito doutra forma, a divulgação do segredo somente causou transtornos à paciente, sendo incapaz de remediar qualquer mal ou evitar qualquer conduta criminosa. Ressalte-se que é cristalino que não há de se falar em consentimento escrito da paciente.

Resta necessário, portanto, verificar se a conduta do médico que notifica o aborto praticado pela paciente encontra-se autorizada por imposição de dever legal que lhe obrigue a informar o segredo. 

Nos termos do ordenamento jurídico brasileiro, existem algumas poucas situações nas quais subsiste o dever médico de notificar fatos que teve conhecimento em decorrência da relação profissional com seu paciente, relativizando o segredo do profissional sanitário. Sem a pretensão de esgotar todas as possibilidades, destaca-se três situações mais usuais nas quais se reconhece o dever médico de informar as autoridades competentes sobre fatos que teve ciência no exercício de sua profissão:

a)  Denúncia de doença cuja notificação é compulsória (art. 269,Código Penal). 

Art. 269 - Deixar o médico de denunciar à autoridade pública doença cuja notificação é compulsória:
Pena - detenção, de seis meses a dois anos, e multa.

b) Notificação compulsória de casos que envolvam suspeita ou confirmação de maus-tratos de criança ou adolescente (art. 245 do Estatuto da Criança e do Adolescente).

Art. 245. Deixar o médico, professor ou responsável por estabelecimento de atenção à saúde e de ensino fundamental, pré-escola ou creche, de comunicar à autoridade competente os casos de que tenha conhecimento, envolvendo suspeita ou confirmação de maus-tratos contra criança ou adolescente:
Pena - multa de três a vinte salários de referência, aplicando-se o dobro em caso de reincidência.

c) Comunicação compulsória de crime de ação penal pública (art. 66 da Lei de Contravenções Penais).

Art. 66. Deixar de comunicar à autoridade competente:
I – crime de ação pública, de que teve conhecimento no exercício de função pública, desde que a ação penal não dependa de representação;
II – crime de ação pública, de que teve conhecimento no exercício da medicina ou de outra profissão sanitária, desde que a ação penal não dependa de representação e a comunicação não exponha o cliente a procedimento criminal:
Pena – multa, de trezentos mil réis a três contos de réis.

De imediato, reconhece-se que o caso em pauta não se enquadra em nenhuma das duas primeiras hipóteses que impõem o dever legal de informação. Por evidente, o aborto não constitui-se doença cuja notificação é compulsória; também não se trata de caso envolvendo maus-tratos de crianças e adolescentes, uma vez que o feto não se enquadra nenhuma destas qualificações. Resta verificar a terceira hipótese.

A Lei de Contravenções Penais impõe aos funcionários públicos (art. 327, Código Penal) e aos profissionais sanitários o dever legal de comunicar a autoridade competente a ocorrência de qualquer crime de ação penal pública incondicionada. 

Nota-se que no Direito Penal brasileiro, os crimes de ação pena pública incondicionada são aqueles nos quais a legitimidade para a propositura da denúncia é do Ministério Público, que independe de qualquer manifestação de concordância do ofendido ou de seu representante legal para tanto. Destaca-se a redação do art. 100 do Código Penal:

Art. 100 - A ação penal é pública, salvo quando a lei expressamente a declara privativa do ofendido.
§ 1º - A ação pública é promovida pelo Ministério Público, dependendo, quando a lei o exige, de representação do ofendido ou de requisição do Ministro da Justiça
§ 2º - A ação de iniciativa privada é promovida mediante queixa do ofendido ou de quem tenha qualidade para representá-lo
§ 3º - A ação de iniciativa privada pode intentar-se nos crimes de ação pública, se o Ministério Público não oferece denúncia no prazo legal.
§ 4º - No caso de morte do ofendido ou de ter sido declarado ausente por decisão judicial, o direito de oferecer queixa ou de prosseguir na ação passa ao cônjuge, ascendente, descendente ou irmão.

O Código Penal estabelece que os crimes de ação penal pública incondicionada constituem-se em regra no conjunto dos delitos previstos na legislação brasileira. Isso importa em reconhecer que, somente quando expressamente previsto, um delito poderá ser compreendido como de ação penal pública condicionada à representação ou como de ação penal privada. 

Assim conhecendo a regra, pode-se afirmar que o delito de aborto, em qualquer uma das modalidades previstas (arts. 124, 125 e 126 do Código Penal), é crime de ação penal pública incondicionada. Essa informação, por si só, não responde a pergunta se o médico tinha o dever legal de notificar a autoridade policial da realização de aborto por sua paciente. 

É de capital importância para a resolução do problema a observação que, ainda que tanto o funcionário público (art. 327, CP) quanto o profissional sanitário tenham o dever de notificar a ocorrência de crime de ação penal pública incondicionada do qual tenham conhecimento em razão do exercício de suas tarefas,  este dever recai sobre um e outro de forma diferenciada.

O funcionário público possui o dever legal de comunicar a prática de fato definido como crime de ação penal pública incondicionada, seja qual for a situação. Por outro lado, o médico somente será obrigado a informar a prática de crime do qual teve ciência no exercício de sua profissão, se e somente se, a revelação do sigilo médico não exponha o paciente a procedimento criminal. E se o médico, além de profissional sanitário, for também funcionário público? Nesta hipótese, que acontece, p. e., em situações nas quais o médico atende pelo SUS, prevalece a qualidade de profissional sanitário, porquanto a regra do art. 66. II da Lei de Contravenções Penais faz-se cláusula de exceção da norma disposta no art. 66, I, do mesmo diploma legal.

Como a notificação do aborto expõe a paciente a procedimento criminal, entre o interesse público de conhecer a prática do crime e o sigilo médico, prevalecerá este em detrimento daquele.

Sendo assim, considerando como completas, precisas e verdadeiras todas as informações noticiadas sobre o fato, o médico que notificou o aborto praticou o delito previsto no art. 154 do Código Penal, pois não estava autorizado a violar o sigilo médico, isso porque sua ação não se enquadra em nenhuma das hipóteses excepcionantes do segredo profissional.

A RESPOSTA
O médico está impedido pelas imposições éticas e legais decorrentes do sigilo profissional de informar a prática de crime - mesmo os de ação pública incondicionada - quando a revelação do segredo expor seu paciente a procedimento criminal. No caso em pauta, portanto, o médico não poderia ter violado a confiança da paciente. Tal comportamento não só ofende as normas éticas que pautam o exercício da medicina mas, também, constitui-se em ilícito penal, a saber,o delito previsto no art. 154 do Código Penal ("Revelar alguém, sem justa causa, segredo, de que tem ciência em razão de função, ministério, ofício ou profissão, e cuja revelação possa produzir dano a outrem: Pena - detenção, de três meses a um ano, ou multa").

TJRJ: Thor Batista é absolvido por atropelamento e morte de ciclista


Por dois votos a um, a 5ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Rio absolveu nesta quinta-feira, dia 19, o empresário Thor Batista no processo pelo atropelamento e morte do ciclista Wanderson dos Santos, em Duque de Caixas, na Baixada Fluminense, em março de 2012. Com base no artigo 386, inciso VII do Código de Processo Penal, o colegiado considerou que não ficou provado nos autos que o réu agiu com imprudência, já que a prova pericial produzida no processo não atestou de forma conclusiva que ele estivesse dirigindo acima da velocidade permitida no local do acidente. Além disso, segundo a decisão, a prova testemunhal também foi considerada precária para embasar uma condenação. Cabe pedido de recurso nos tribunais superiores.

Em junho de 2013, o jovem foi condenado pelo juízo da 2ª Vara Criminal de Duque de Caxias a prestar dois anos de serviços comunitários, a suspensão da carteira de habilitação pelo mesmo período e a pagar multa de R$ 1 milhão por homicídio culposo - sem intenção de matar.  A defesa apelou, pedindo preliminarmente a anulação da denúncia do Ministério Público e também a reforma da sentença que condenou Thor.

O recurso começou a ser votado em 6 de novembro do ano passado. Na ocasião, o relator do processo, desembargador Cairo Italo, votou no sentido de prover parcialmente a apelação apenas para reduzir o prazo da suspensão do direito de conduzir veículos automotores para dois meses, e reduzir o valor da prestação pecuniária para 50 salários mínimos, mantendo a condenação de prestação de serviços comunitários. A votação, no entanto, foi suspensa em razão de um pedido de vista do desembargador Paulo Baldez.

Nesta quinta-feira, com a retomada da votação, o desembargador Paulo Baldez votou pela reforma da sentença e absolvição do empresário, sendo acompanhado pelo desembargador Luiz Felipe Haddad.  

Processo No: 0026925-48.2012.8.19.0021



TJSP: Mãe que tentou matar filhos com iogurte envenenado será julgada pelo Tribunal do Júri


Acordão da 14ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça paulista confirmou decisão da Comarca da Capital que determinou o julgamento, pelo Tribunal do Júri, de uma mulher que teria tentado matar os filhos com veneno, em julho de 2012.

Segundo o Ministério Público, a ré agiu por vingança, por não aceitar o fim do relacionamento com o ex-marido. Ela ofereceu aos filhos, à época com 7 e 8 anos, iogurte com veneno para matar rato e ingeriu a mistura em seguida. Todos sobreviveram porque foram socorridos a tempo.

Para o desembargador Hermann Herschander, a autoria e a materialidade dos fatos estão comprovadas por meio de provas técnicas, e os laudos de exame de corpo de delito atestaram que as vítimas sofreram lesões corporais graves. “É o quanto basta para submeter o feito ao Conselho de Sentença, que examinará a integralidade do acervo probatório e dirimirá as dúvidas que deste porventura exsurjam.”


Os desembargadores Walter da Silva e Marco Antonio De Lorenzi participaram do julgamento, que teve votação unânime.

CNJ: A previsão legal e as vantagens da tornozeleira eletrônica


A colocação de tornozeleiras eletrônicas em pessoas investigadas e condenadas está entre as alternativas adotadas pelas autoridades para frear o encarceramento em massa no Brasil, hoje com uma das maiores populações prisionais do mundo, de 581.507 detentos (dados do Ministério da Justiça de dezembro de 2013). Essa tecnologia permite que, a partir de uma central de monitoração, servidores da Administração Penitenciária dos estados acompanhem, à distância, os deslocamentos dos vigiados.
 
A monitoração eletrônica tem base legal relativamente recente no País, sendo prevista, inicialmente, na Lei n. 12.258/2010, que alterou a Lei de Execução Penal (Lei n. 7.210/1984) para permitir o emprego dessa tecnologia na fiscalização do cumprimento de benefícios penais por condenados, entre eles a saída temporária e a prisão domiciliar.

Já a Lei n. 12.403/2011 alterou o Código de Processo Penal (Decreto-Lei n. 3.689/1941) e admitiu a monitoração eletrônica também como medida cautelar diversa da prisão – uma estratégia para enfrentar o alto índice de presos provisórios (réus que aguardam na prisão o julgamento de seus processos), hoje de 41% da população carcerária nacional. Entre as medidas cautelares está a proibição de o investigado ou processado frequentar determinados lugares como bares, casas noturnas e estabelecimentos congêneres.

Como a legislação sobre o uso de tornozeleiras é recente, nem todas as unidades da federação utilizam essa tecnologia. Para ampliar o seu emprego, o Departamento Penitenciário Nacional (Depen) do Ministério da Justiça repassa recursos por meio de parcerias que foram firmadas, até o momento, com o Distrito Federal e os estados de Alagoas, Bahia, Goiás, Paraíba, Maranhão, Mato Grosso do Sul, Espírito Santo, Tocantins e Santa Catarina. 

Vantagens  Segundo o Depen, além de evitar que investigados e condenados entrem em contato com o ambiente estigmatizante das prisões, a monitoração eletrônica também traz economia aos cofres públicos. Enquanto um preso custa, em média, R$ 1,8 mil por mês, a monitoração eletrônica de uma pessoa pode custar de R$ 200 a R$ 600 mensais, dependendo dos termos contratuais da empresa fornecedora dos equipamentos, informou o órgão federal.

Outro benefício trazido pela tecnologia, conforme o Depen, é a aplicação de tornozeleiras em pessoas consideradas em situação de vulnerabilidade dentro do sistema prisional, como, por exemplo, gestantes, portadores de doenças infectocontagiosas, condenados maiores de 70 anos de idade, mulheres com filho menor e portadores de deficiência física ou mental.


O órgão destaca ainda a eficácia da tecnologia no controle de fugas, pois os equipamentos possuem sensores que identificam a proximidade da tornozeleira com a pele, além de outros destinados a alertar para o seu rompimento. Quando a pessoa vigiada viola as regras, geralmente ela perde os benefícios legais e vai para a prisão. No estado de São Paulo, de uma população carcerária de 222.577 detentos, 4.800 (2,15%) usam tornozeleiras, todos cumpridores de pena no regime semiaberto. No Rio de Janeiro, de um total de 40.984 detentos, 1.441 (3,51%) usam tornozeleiras, sendo a maioria cumpridores de prisão domiciliar.

STF: ADEPOL questiona a constitucionalidade da audiência de custódia



Provimento conjunto do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) e da Corregedoria Geral da Justiça do estado, que obriga delegado de polícia a apresentar ao juiz pessoa detida em flagrante em até 24 horas após a prisão (audiência de custódia), está sendo questionado no Supremo Tribunal Federal (STF) pela Associação dos Delegados de Polícia do Brasil (Adepol/Brasil) na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5240, que tem como relator o ministro Luiz Fux.

A Adepol sustenta que a chamada “audiência de custódia” é uma inovação no ordenamento jurídico paulista, não prevista no Código de Processo Penal (CPP), e somente poderia ter sido criada por lei federal e jamais por intermédio de tal provimento autônomo, já que o poder de legislar sobre a matéria é do Congresso Nacional. Além disso, segundo a entidade, a norma repercutiu diretamente nos interesses institucionais dos delegados de polícia, cujas atribuições são determinadas pela Constituição (artigo 144, parágrafos 4º e 6º).

“Este [Provimento Conjunto nº3/2015], sim, foi inovador no ordenamento jurídico, entretanto, muito embora possa parecer um ato legítimo em sua aparência, é ilegítimo no exame de fundo. Trata-se, na espécie, inequivocamente, de ato normativo editado que configura uma inconstitucionalidade direta, imediata e formal, com abuso de poder”, sustenta a Adepol.




segunda-feira, 23 de fevereiro de 2015

STJ: Confirmada expulsão da PM de policial que assediou sexualmente menor de 12 anos.


Acompanhando o voto do relator, ministro Humberto Martins, a Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) rejeitou recurso de policial militar que foi expulso da corporação por praticar ato libidinoso com uma menor. Ele queria que seu pedido de revisão da pena fosse apreciado pelo secretário de Segurança Pública ou pelo governador de São Paulo.

De acordo com os autos, o policial – embriagado, de folga e vestindo trajes civis – foi preso em flagrante dentro de um bar por ter acariciado e assediado uma menina de 12 anos com nítida conotação sexual. O delito aconteceu em novembro de 2010.

A pena de expulsão foi aplicada pelo comandante-geral da Polícia Militar de São Paulo após processo administrativo disciplinar. O pedido de revisão apresentado pelo militar foi negado pelo comandante, e o Tribunal de Justiça de São Paulo também lhe negou o mandado de segurança ali impetrado.

Competência
O policial recorreu ao STJ, alegando que seu recurso administrativo deveria ter sido apreciado pelo secretário de Segurança ou pelo governador. Sustentou ainda que não há provas suficientes para justificar a pena aplicada, que a sanção foi desproporcional e que houve cerceamento de defesa.

Em seu voto, o ministro relator confirmou a posição do tribunal paulista, segundo a qual a autoridade competente para apreciar o pedido de revisão é a mesma que aplicou a sanção disciplinar, ou seja, o comandante-geral da PM.

Segundo Humberto Martins, a Lei Complementar Estadual 893/01 coloca o secretário de Segurança e o comandante da PM no mesmo grau hierárquico para fins de aplicação de penas disciplinares.

Portanto, concluiu o relator, tanto o secretário de Segurança quanto o governador agiram rigorosamente dentro da legalidade ao entender que a competência para analisar o pedido de revisão da pena era do comandante-geral.

Leia a íntegra do voto do relator.

STJ: Manipular preço de ações na bolsa não constitui-se em delito de gestão fraudulenta


Em julgamento de recurso especial, a Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) afastou a imputação de crime de gestão fraudulenta feita pelo Ministério Público contra dois dirigentes de uma corretora de valores acusados de manipular o preço de ações e realizar práticas não equitativas contra fundos de pensão.

O caso aconteceu no Rio Grande do Sul, entre janeiro de 1993 e dezembro de 1994. De acordo com a denúncia, os dois diretores utilizavam as carteiras de clientes da corretora para realizar operações simuladas de compra e venda de ações com a finalidade de elevar a cotação e revendê-las em curto prazo com lucro, em prejuízo de fundos de pensão.

Denunciados pela prática dos delitos previstos no artigo 4º,caput, da Lei 7.492/86 (gestão fraudulenta), em continuidade delitiva, e artigo 3º, inciso VI, da Lei 1.521/51 (crime contra a economia popular), em concurso formal, os dois acusados impetraram habeas corpus com pedido de trancamento da ação penal por falta de justa causa, diante da atipicidade das condutas.

Conduta x infração
O Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) deu parcial provimento ao pedido. Em relação ao crime contra a economia popular, determinou a remessa dos autos à Justiça estadual, competente para julgar o feito.

Quanto ao crime de gestão fraudulenta de instituição financeira, o TRF4 entendeu que, embora a peça acusatória tenha sido amparada em documentos originados de procedimento administrativo da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), não há correspondência entre a conduta dos acusados e a infração criminal prevista no artigo 4º,caput, da Lei 7.492.

Segundo o acórdão, não houve prejuízo para a instituição financeira administrada pelos diretores. Além disso, as práticas a eles imputadas não se deram na corretora, mas no âmbito do mercado de valores.

A decisão também destacou a edição da Lei 10.303/01, que tipificou os crimes contra o mercado de capitais, mas, frente à irretroatividade da lei penal gravosa, afastou sua aplicação ao caso.

Acórdão mantido
No STJ, o ministro Nefi Cordeiro, relator do recurso interposto pelo Ministério Público, ratificou a decisão do TRF4: “Incensurável a conclusão de que as práticas imputadas não se inserem no âmbito da gerência interna do empreendimento, mas sim na esfera de atuação dos seus diretores no mercado de valores. Não há indicativos, por exemplo, da utilização de meios fraudulentos, falsidade documental ou desvio de valores.”

Com esse entendimento, a Sexta Turma não reconheceu violação à Lei 7.492 e manteve a decisão do TRF4.

STJ: Principais decisões sobre indenizações decorrentes de abuso de autoridade


Lei 4.898/65, que pune o abuso de autoridade, completa 50 anos em 2015. Ela regula o direito de representação e o processo de responsabilidade administrativa, civil e penal contra autoridades que cometem abusos no exercício de suas funções.

O extenso rol das condutas consideradas abusivas é apresentado nos artigos 3º e 4º da lei, que se aplica a qualquer pessoa que exerça cargo ou função pública, de natureza civil ou militar.

O Estatuto do Servidor (Lei 8.112/90) e a Lei de Improbidade Administrativa (Lei 8.429/92) também constituem importantes instrumentos para coibir práticas ilícitas por parte de agentes policiais e demais servidores que abusam do poder conferido pelo cargo.

Nos últimos três anos, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) julgou diversos casos de abuso de autoridade cometido por policiais.

Prisão ilegal
O cidadão vítima de abuso de autoridade pode buscar indenização por dano moral na Justiça. Foi o que aconteceu com um homem que participava de culto religioso em um terreiro no estado do Maranhão. Por volta de 1h do dia 6 de janeiro de 2008, três policiais militares o abordaram de forma truculenta, questionando de quem era a bicicleta que usava.

Após os policiais lhe darem voz de prisão sob a alegação de desacato, o homem foi levado para a delegacia, onde passou a noite encarcerado. Às 7h, foi posto em liberdade, mas sem a devolução de todos os seus pertences. Não foram devolvidos a bicicleta, que era de sua filha, e R$ 20 que estavam em sua carteira.

Por conta da conduta abusiva dos policiais, o homem ajuizou ação por danos morais e materiais contra o estado do Maranhão. Em primeiro grau, a juíza concluiu que havia comprovação de que a prisão foi ilegal, tendo em vista a falta do auto de prisão e da instauração dos procedimentos previstos no Código de Processo Penal. E prisão ilegal é abuso que deve ser indenizado.

O estado do Maranhão foi condenado a pagar R$ 15 mil a título de indenização por danos morais e R$ 339,73 por danos materiais. A apelação foi rejeitada e a Segunda Turma do STJ negou todos os recursos do estado, que ficou mesmo condenado a indenizar o cidadão preso ilegalmente (AREsp 419.524).

Prova dispensada
Abordagem policial feita com excesso é abuso comum nas ruas e tema recorrente nos tribunais. Segundo a jurisprudência do STJ, essa é uma situação de abuso de autoridade que gera dano moral, sem a necessidade de comprovar prejuízo concreto. A corte considera que os transtornos, a dor, o sofrimento, o constrangimento e o vexame que a vítima experimenta dispensam qualquer outra prova além do próprio fato (REsp 1.224.151).

Dentro do possível, o valor da reparação deve ser capaz de compensar o dano sofrido e, ao mesmo tempo, inibir a repetição da conduta. Para a Justiça, R$ 40 mil foi o valor razoável para atender a esses propósitos no caso de um motorista que, ao parar no semáforo, foi abordado por policiais militares do Ceará que o retiraram do veículo puxando-o pela camisa. Os parentes que estavam com ele também sofreram constrangimento.

Na sentença, ao decidir pelo direito à indenização, o juiz afirmou que "a ação abusiva, desastrosa e irresponsável por parte dos policiais militares quando da abordagem ao autor, no dia 20 de março de 2002, está suficientemente caracterizada e feriu gravemente a moral do promovente, ou seja, os valores fundamentais inerentes à sua personalidade, intimidade, paz e tranquilidade”.

A condenação nesses casos recai sobre o estado, em nome do qual atuavam os servidores que cometeram o abuso; posteriormente, pode o estado ajuizar a chamada ação regressiva contra os agentes, para que arquem com o prejuízo causado aos cofres públicos.

Prisão preventiva
A Primeira Turma decidiu em fevereiro de 2014, no julgamento do ARESp 182.241, que a prisão preventiva e a subsequente sujeição à ação penal não geram dano moral indenizável, ainda que posteriormente o réu seja absolvido por falta de provas.

Em caso dessa natureza, a responsabilidade do estado não é objetiva. Para haver indenização, é preciso comprovar que os seus agentes (policiais, membros do Ministério Público e juízes) agiram com abuso de autoridade.

Por falta dessa demonstração, uma mulher que ficou 17 meses presa preventivamente e depois foi absolvida por falta de provas não conseguiu ser indenizada.

Ajuda abusiva
A autoridade que “quebra um galho” e deixa de cumprir a lei também comete abuso passível de punição. Um agente da Polícia Federal foi demitido do cargo por facilitar a entrada de mercadorias no país sem o pagamento do imposto devido.

Ele intercedeu junto à fiscalização aduaneira do Aeroporto Internacional de Guarulhos para liberar as mercadorias de três pessoas, avaliadas, no total, em quase R$ 500 mil.

Demitido após processo administrativo disciplinar (PAD), recorreu ao STJ na tentativa de anular a punição. Afirmou, entre outras coisas, que já respondia a ação de improbidade administrativa pelos mesmos atos e que não poderia ter sido punido com demissão em âmbito administrativo.

A Primeira Turma manteve a demissão. Os ministros concluíram que não houve nenhuma ilegalidade no processo. Além disso, o PAD e a ação de improbidade, embora possam acarretar a perda do cargo, têm âmbitos distintos, diante da independência entre as esferas criminal, civil e administrativa (MS 15.951).

Abuso do chefe
Policial também é vítima de abuso de autoridade. Um policial rodoviário federal que atuava no Rio Grande do Sul sofreu perseguição de seus superiores e conseguiu indenização por dano moral.

Para a Justiça, a perseguição e o prejuízo para o servidor ficaram comprovados. Em 2002, seu superior distribuiu memorando a outros chefes e seções informando que havia colocado o servidor à disposição porque ele estaria causando problemas de relacionamento com colegas.

Nenhuma unidade no estado quis receber o policial, que nunca teve condenação em prévio processo administrativo disciplinar. Ele acabou sendo removido para o Rio de Janeiro, mas o ato foi anulado em mandado de segurança.

“Pelos fatos incontroversos, depreende-se que a atuação estatal, materializada pela remoção irregular, perseguições funcionais e prejuízos à honra e à reputação do policial rodoviário federal, extrapolou efetivamente o mero aborrecimento, sendo forçoso reconhecer a ocorrência de dano moral, visto que presentes os requisitos da responsabilidade civil: conduta ilícita, dano e nexo de causalidade”, concluiu o ministro Marco Aurélio Bellizze, relator do recurso da União que foi negado pela Quinta Turma do STJ (Ag 1.195.142).

Prazo para punir
A Primeira Turma julgou o recurso (REsp 1.264.612) de um policial federal que, em outubro de 2004, invadiu o local onde a faxineira de seu sogro estava trabalhando, deu-lhe voz de prisão e algemou-a com o objetivo de forçá-la a confessar o furto de uma filmadora. A ação civil pública por ato de improbidade administrativa foi ajuizada pelo Ministério Público quase quatro anos depois do fato, em maio de 2008.

A questão jurídica discutida no caso foi o prazo da administração para punir o servidor público. O relator, ministro Napoleão Nunes Maia Filho, afirmou que a pretensão da administração de apurar e punir irregularidades cometidas por seus agentes – em conluio ou não com particulares – encontra limite temporal no princípio da segurança jurídica, de hierarquia constitucional, porque os administrados não podem ficar indefinidamente sujeitos à instabilidade do poder sancionador do estado.

Por essa razão, aplica-se o instituto da prescrição, que tem a finalidade de extinguir o direito de ação em virtude do seu não exercício em determinado prazo. O artigo 23, inciso II, da Lei de Improbidade Administrativa define que as ações podem ser propostas dentro do prazo prescricional previsto em lei específica para faltas disciplinares puníveis com demissão, que é de cinco anos.

Já o artigo 142, parágrafo 2º, do Estatuto do Servidor prevê para as infrações disciplinares que também constituem crime os prazos de prescrição previstos na lei penal – que, na época dos fatos, estabelecia dois anos para os crimes de abuso de autoridade. Em 2010, com a alteração do inciso VI do artigo 109 do Código Penal, o prazo passou a ser de três anos.

No caso, a conduta do policial foi enquadrada na lei de improbidade, e não houve recebimento de ação penal em razão de acordo feito com o Ministério Público, a chamada transação penal. Como não havia ação penal em curso, a Primeira Turma negou o pedido de aplicação do prazo prescricional do Código Penal e manteve o de cinco anos.