JÚRI POPULAR
Os réus Elissandro Callegaro Spohr, Mauro Londero
Hoffmann, Marcelo de Jesus dos Santos e Luciano Augusto Bonilha Leão, acusados
de serem os responsáveis pelo incêndio na Boate Kiss, em Santa Maria, serão
julgados pelo Tribunal do Júri. Caberá ao Conselho de Sentença, formado por
sete jurados, decidir se os quatro são culpados ou inocentes das acusações de
homicídio duplamente qualificado (242 vezes consumado e 636 vezes tentado), apontadas
pelo Ministério Público Estadual.
Em decisão de 195 páginas proferida nesta manhã, o
Juiz de Direito Ulysses Fonseca Louzada, titular da 1ª Vara Criminal da Comarca
de Santa Maria, entendeu que há presença de materialidade e indícios
suficientes de que os acusados teriam praticado o fato nos termos da denúncia
do Ministério Público.
"As versões defensivas, embora possam existir,
não restaram demonstradas de forma cabal, uníssona, numa única direção para que
possam subtrair o julgamento pelo Conselho de Sentença", considerou o
magistrado.
CASO
Na madrugada de 27/1/13, a Boate Kiss, localizada
na área central de Santa Maria, sediava uma festa universitária, com show da
banda Gurizada Fandangueira. Durante a apresentação, o grupo utilizou um tipo
de fogo de artifício (conhecido como "chuva de prata") que atingiu o
teto da danceteria, e teria dado início ao incêndio que matou 242 pessoas e
deixou outras 636 feridas.
De acordo com a denúncia do MP, as centelhas
entraram em contato com a espuma altamente inflamável que revestia parcialmente
paredes e teto do estabelecimento, principalmente junto ao palco, desencadeando
o fogo e a emissão de gases tóxicos.
DENÚNCIA
Os empresários Elissandro Spohr e Mauro Hoffmann e
os músicos Marcelo Santos e Luciano Leão tiveram a prisão decretada em 28/1/13.
A liberdade foi concedida, por meio de recurso, pela 1ª Câmara Criminal do
Tribunal de Justiça, em 29/5/13.
A denúncia contra os quatro é assinada pelos
Promotores de Justiça Maurício Trevisan e Joel Oliveira Dutra e foi acolhida
pela Justiça em 3/4/13. No documento, os membros do MP argumentaram que
Elissandro e Mauro concorreram para o crime, implantando em paredes e no teto
da boate espuma altamente inflamável e sem indicação técnica de uso;
contratando um show que sabiam incluir exibições com fogos de artifício;
mantendo a casa noturna superlotada, sem condições de evacuação e segurança
contra fatos dessa natureza.
O mesmo teriam feito Marcelo e Luciano, que,
conhecendo bem o local do fato, onde já haviam se apresentado, adquiriram e
acionaram fogos de artifício, que sabiam se destinar a uso em ambientes
externos, e direcionaram para o teto da boate, dando início à queima do
revestimento inflamável.
Conforme a acusação, os crimes foram cometidos
mediante meio cruel, haja vista o emprego de fogo e a produção de asfixia nas
vítimas.
Ao analisar o caso, o Juiz Ulysses Louzada
considerou que as qualificadoras merecem admissão. "A respeito da
qualificadora do motivo torpe havendo indícios nos autos de que os denunciados
Mauro e Elissandro teriam economizado com a utilização de espuma inadequada
como revestimento acústico e não investiram em segurança contra incêndios,
também lucrando com a superlotação do estabelecimento; e havendo indícios de
que os acusados Marcelo e Luciano adquiriram fogos de artifício para uso
externo, por ser mais barato que o indicado para ambientes internos, a
qualificadora deverá ser levada à apreciação pelo Tribunal Popular",
afirmou o Juiz.
"Da mesma forma, quanto à qualificadora do
meio cruel, haja vista a existência de indícios do emprego de fogo e a produção
de asfixia nas vítimas, esta também deverá ser levada para apreciação dos
jurados", acrescentou o magistrado.
FASE DE INSTRUÇÃO
O processo criminal que apura o caso é constituído
por 21 mil páginas, separadas em 99 volumes. Ao longo da instrução processual,
foram ouvidas 204 pessoas, sendo 114 vítimas, 16 testemunhas de acusação, 50
testemunhas de defesa, 2 testemunhas referidas, 18 peritos e os 4 réus.
Foram realizadas audiências em Santa Maria, Porto
Alegre, Rosário do Sul, Uruguaiana, Passo Fundo, Horizontina, Frederico
Westphalen, Bagé, Alegrete, Tupanciretã, Colombo (PR), Teresina (PI), Tubarão
(SC), Chapecó (SC), Campo Grande (MS) e Rio de Janeiro (RJ).
CISÃO PROCESSUAL
Além do processo principal, a apuração do caso está
desdobrada em outros três processos criminais e dois cíveis:
Processo n° 2140011071-5 (falsidade ideológica,
fraude processual e falso testemunho)
Processo n° 2130006197-6 (fraude processual)
Processo n° 2130006199-2 (falso testemunho)
Processo n° 1130004136-6 (Ação coletiva)
Processo n° 1130010831-2 (Ação Civil Pública)
Outras centenas de ações individuais de indenização
tramitam na Justiça de Santa Maria.
CONDENAÇÃO
O primeiro julgamento de um dos processos conexos
ao caso, o 2130006197-6, ocorreu em 1°/9/15, quando o ex-chefe do Estado Maior
do 4º Comando Regional dos Bombeiros de Santa Maria, major Gerson da Rosa
Pereira, foi condenado a seis meses de detenção pelo delito de fraude em
documentos relacionados ao inquérito policial que apurou as causas do incêndio
na Boate Kiss. A pena foi convertida em prestação de serviços à comunidade. Ele
recorreu da decisão. O recurso se encontra para análise na 4ª Câmara Criminal
do TJ.
Proc. n 2130000696-7 (Comarca de Santa Maria)