quarta-feira, 17 de agosto de 2016

STF: Afastada a aplicação do princípio da insignificância em caso de desvio de água (art. 155, §3º do CP)


O ministro Teori Zavascki, do Supremo Tribunal Federal (STF), negou seguimento (julgou inviável) ao Recurso Ordinário em Habeas Corpus (RHC) 135800, apresentado por uma mulher condenada pelo Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT) à pena de um ano de reclusão, em regime aberto, pelo desvio na rede de fornecimento de água tratada sem hidrômetro, prática enquadrada como furto (artigo 155, caput e parágrafo 3º, do Código Penal). Segundo o ministro, o caso não permite a aplicação do princípio da insignificância, como pretendia a defesa da recorrente. 

O recurso foi interposto contra decisão do Superior Tribunal de Justiça em HC lá impetrado. Ao STF, a defesa alegou a inexpressividade da lesão provocada pela conduta e a ausência de dano ao patrimônio público, pois a Companhia de Saneamento Ambiental do Distrito Federal (Caesb), responsável pelo fornecimento de água no DF, tem natureza de pessoa jurídica de direito privado, na forma de sociedade de economia mista.

Decisão 
Segundo o ministro Teori, porém, a verificação da insignificância envolve um juízo de tipicidade conglobante, “muito mais abrangente que a simples expressão do resultado da conduta”, a fim de impedir que, com base apenas no resultado material, se desvirtue o objetivo do legislador ao formular a tipificação legal. 

No caso, o ministro assinalou que a ação e o resultado da conduta assumem, em tese, nível suficiente de reprovabilidade que os descaracterizam como insignificantes. “A utilização clandestina de água tratada, destinada ao abastecimento de toda a coletividade, sem o registro obrigatório no hidrômetro, é conduta dotada de acentuada ofensividade a interesses do Estado”, concluiu, citando diversos precedentes nos quais o STF deixou de reconhecer a aplicação do princípio da insignificância.



Comentários rabugentos
Consolida-se na jurisprudência do STF que a insignificância de um determinado ilícito não pode ser auferida com referência, tão somente, em relação ao montante de prejuízo causado. A atipicidade material da conduta decorrente da bagatela somente pode ser reconhecida através de um juízo amplo sobre reprovabilidade da conduta, em conformidade com a decisão paradigmática do Min. Celso de Mello:

"Consoante entendimento jurisprudencial, o ‘princípio da insignificância - que deve ser analisado em conexão com os postulados da fragmentaridade e da intervenção mínima do Estado em matéria penal - tem o sentido de excluir ou de afastar a própria tipicidade penal, examinada na perspectiva de seu caráter material. (...) Tal postulado - que considera necessária, na aferição do relevo material da tipicidade penal, a presença de certos vetores, tais como (a) a mínima ofensividade da conduta do agente, (b) a nenhuma periculosidade social da ação, (c) o reduzidíssimo grau de reprovabilidade do comportamento e (d) a inexpressividade da lesão jurídica provocada - apoiou-se, em seu processo de formulação teórica, no reconhecimento de que o caráter subsidiário do sistema penal reclama e impõe, em função dos próprios objetivos por ele visados, a intervenção mínima do Poder Público.'" (HC no 84.412-0/SP, STF, Min. Celso de Mello, DJU 19.11.2004).

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