segunda-feira, 28 de abril de 2014

Mitos sobre assassinos em série





Autor: Unidade de Análise Comportamental - 2 (FBI)
Tradução: O Rabujo
 
O assassino serial não é um novo fenômeno, tampouco, unicamente americano. Desde tempos ancestrais, a atuação de assassinos seriais tem sido relatada ao redor do mundo. No Europa do século XIX, Dr. Richard von Krafft-Ebing conduziu a primeira pesquisa documental sobre criminosos sexuais violentos e os crimes que eles cometeram. Mais conhecido por seu manual de 1886 - Psychopathia Sexualis - Dr. Kraft-Ebing descreveu inúmeros estudos de casos de homicídios com conotação sexual, assassinatos seriais e outros casos de inclinação sexual.

O assassinato serial é um evento relativamente raro, sendo estimado corresponder a 1% do total de homicídios cometidos em um determinado ano. Porém, existe um interesse macabro neste tópico que excede seu âmbito e gera incontáveis artigos, livros e filmes. Esta audiência, produto do fascínio do público, começou no final dos anos 1880, depois de uma série de assassinatos não resolvidos que tiveram lugar Londres, na região de Whitechapel. Estes assassinatos foram cometidos por um indivíduo desconhecido que chamava a si mesmo de “Jack, o Estripador” e que mandava cartas para a polícia clamando a autoria dos crimes. 

Caro Chefe,
Fico a escutar que a polícia está prestes a me pegar, mas eles ainda não pegaram. Eu fico dando risadas enquanto eles se fazem de espertos e ficam a dizer que estão na pista correta. A piada sobre o Avental de Couro foi muito boa. Eu vou continuar atacando e rasgando as putas até ficar entediado. Muito bom trabalho foi a última delas. Eu não dei àquela senhora a chance de gritar. Como eles podem me pegar agora. Eu amo meu trabalho e quero começar de novo. Muito em breve terão notícias de mim e de meus joguinhos divertidos. Eu guardei um pouco de sangue em uma garrafa da última vez para poder escrever, mas a coisa ficou grudenta como cola e eu não consegui usar. Espero que tinta vermelha faça bem o serviço, há, há. No próximo trabalho que farei, eu vou arrancar as orelhas da senhora e mandar para os policiais, só por diversão. Mantenha esta carta com você até eu fazer mais alguma coisa, então pode liberar. Minha faca está tão boa e afiada que eu quero voltar a trabalhar o mais rápido possível assim que tiver a oportunidade. Boa sorte.
Sinceramente seu,
Jack, o Estripador. 

Estes assassinatos e o nom de guerre “Jack, o Estripador” se tornaram sinônimos de assassinatos seriais. Esse caso acabou por criar vários mitos sobre assassinatos seriais e os homicidas que os praticam. Nos anos 1970 e 1980, vários casos de homicídios como os do Assassino de Green River, Ted Bundy, e do BTK renovaram o interesse público sobre assassinatos em série. Esse fenômeno atingiu seu ápice com o lançamento de alguns filmes nos anos 1990, dentre eles, destacando O Silêncio dos Inocentes.

Neste sentido, muito do conhecimento popular sobre assassinos em série é derivado destas produções hollywoodianas. Porém, os roteiros são criados mais para satisfazer os interesses das audiências, do que para produção de um retrato acurado do assassino serial. Por focar nas atrocidades perpetradas contra as vítimas pelos enlouquecidos homicidas, o público resta cativado pelos criminosos e seus crimes. Isso somente contribui incrementar a confusão sobre a verdadeira dinâmica do assassinato em série.

Os profissionais das agências policiais são objeto da mesma desinformação desde diferentes fontes: o uso de informações anedóticas. Profissionais envolvidos em casos de assassinato em série, como investigadores, promotores e patologistas podem ter uma exposição limitada ao assassinato em série. A experiência destes pode estar baseada em uma única série de crimes, e os fatores, neste caso, são extrapolados para outros casos.  Como resultado, certos estereótipos e falsas concepções sobre a natureza do assassinato em série e as características dos homicidas seriais encontram terreno fértil.

Uma grande tendência desta formação de falácias sobre os assassinos em séries é produto dos consultores da grande mídia. Recebendo credibilidade da imprensa, estas autoproclamadas autoridades professam possuir certa expertise sobre o tema. Eles aparecem com frequência na televisão e nos jornais impressos e especulam sobre os motivos dos crimes e as características do possível criminoso, geralmente sem qualquer lastro nas evidências colhidas nas investigações. Infelizmente, comentários inapropriados podem perpetuar falsas concepções sobre tais crimes seriais e, inclusive, comprometer os esforços investigativos da polícia.

A relativa raridade os assassinatos em série, combinada com as informações imprecisas e anedotárias e os retratos ficcionais dos homicidas em série resultaram nos seguintes mitos e falsas concepções sobre assassinos seriais: 

1) Mito: Assassinos em série são todos indivíduos disfuncionais. 

A maioria dos assassinos em série não é formada por pessoas desajustadas socialmente ou reclusos que vivem sozinhos. Eles não são monstros e podem não aparentar nenhuma estranheza. Muitos assassinos escondem-se a plena vista e estão integrados em suas comunidades. Assassinos seriais, com frequência, possuem famílias e lares, estão empregados, e aparentam serem membros normais da comunidade. Uma vez que muitos homicidas seriais conseguirem se misturar em sociedade sem demasiado esforço, não raro passam despercebidos pelo público e pelas autoridades policiais. 

2. Mito: Assassinos em série são todos homens brancos. 

Ao contrário da crença popular, assassinos em série estão espalhados por todos os grupos étnicos. Existem assassinos em série brancos, afroamericanos, hispânicos e asiáticos. A diversificação racial dos assassinos em série é um espelho da composição social da população norte-americana. 

3. Mito: Os assassinos em série possuem somente motivações sexuais. 

Não todos os assassinos em série possuem motivação sexual. Existem muitas outras motivações para assassinos seriais incluindo ódio, emoção, ganho financeiro e busca por atenção. 

4. Mito: Todos os assassinos em série operam viajando ou em diversos estados.

A maioria dos assassinos em série possuem áreas geográficas de operação bastante definidas. Eles conduzem suas matanças dentro das suas áreas de conforto e usualmente definem um ponto de ancoragem (p.e., local de residência, de trabalho ou morada de um parente). Assassinos seriais irão, algumas vezes, desenvolver suas atividades para além de sua área de conforto, isso quando a sua confiança aumenta em decorrência da obtenção de experiência e da bem sucedida evitação das autoridades. Pouquíssimos assassinos desenvolvem suas atividades para além dos limites estaduais.

Os pouco assassinos em série que desenvolvem crimes interestaduais são agrupados em algumas categorias: (a) Indivíduos itinerantes; (b) moradores de rua viajantes; (c) pessoas com trabalhos que demandam constantes viagens, como motoristas de caminhão e militares.

A diferença entre estes tipos de criminosos e outros assassinos em série é, justamente, o estilo de vida viajante, que acaba por prove-lo com muitas zonas de conforto no qual desenvolve suas operações. 

5. Mito: Assassinos em série não conseguem parar de matar.

É ampla a crença de que uma vez que assassinos em série começam a matar, eles não conseguem parar. Existem, entretanto, alguns assassinos em série que pararam de matar antes mesmo de serem pegos. Nestes casos, ocorrem algumas circunstâncias na vida de tais criminosos que os impedem de continuar na caça de novas vítimas. Isso inclui um possível incremento de atividades familiares, casos de substituição sexual, entre outras situações. 

6. Mito: Todos os assassinos em série são insanos ou gênios criminosos.

Outro mito que existe é que assassinos em série ou são pessoas com problemas mentais ou são extremamente astutas e inteligentes.

Como grupo, os assassinos em série possuem uma enorme variedade de desordens de personalidade, incluindo a psicopatia, distúrbio de personalidade antissocial, entre outras. A maioria, entretanto, não pode ser categorizada como insana segundo padrões judiciais.

A mídia criou um grande número de personagens ficcionais que são assassinos em séries e "gênios", que sempre estão um passo à frente das forças policiais. Entretanto, assim como a população geral, a inteligência da maioria destes assassinos é mediana ou ligeiramente superior.

7. Mito: Assassinos em série querem ser pegos

Criminosos que cometem crimes pela primeira vez são inexperientes. Eles ganham experiência e confiança a cada novo crime, e eventualmente deixam-se levar por alguns erros e problemas.

Enquanto a maioria dos assassinos em série planeja seus crimes com mais zelo do que outros criminosos, a curva de aprendizagem ainda é muito escorregadia. Eles precisam selecionar, aproximar-se, controlar e dispor das vítimas. A logística envolvida na prática de um crime e na disposição do cadáver pode ser extremamente complexa, especialmente quando existem várias localidades envolvidas.

Conforme os assassinos em série continuam suas atividades sem serem capturados, eles, usualmente, sentem-se confiantes na crença de que não serão identificados. Conforme a série criminosa continua, os assassinos começam a tomar atalhos quando da prática dos crimes. Isso, muitas vezes, implica que os assassinos se arriscam mais, permitindo sua identificação pelas forças policiais. Não é, portanto, que os assassinos em série querem ser pegos; eles acreditam que não podem ser pegos.

FONTE: Serial Murder: Multi-disciplinary perspectives for investigators. Unidade de Análise Comportamental (FBI). Páginas 2- 6.

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